Publicado originalmente em 21 de maio de 2020
A pandemia de COVID-19, ao expor a assombrosa incompetência e indiferença dos governos capitalistas em todo o mundo em relação às vidas das pessoas, intensificou enormemente o confito de classe. Nos últimos meses, os trabalhadores da Itália, Estados Unidos e Brasil lançaram uma onda de greves selvagens para exigir equipamentos de proteção individual e o direito de se abrigar em casa. Conforme os governos, bancos e sindicatos internacionalmente organizam uma campanha politicamente criminosa para que os trabalhadores voltem ao trabalho sem testes ou proteção suficientes, a pandemia está desmascarando os grupos de classe média pró-imperialistas que a classe dominante promove falsamente há décadas como “esquerdistas”.
Os trabalhadores só podem combater a pandemia através de uma ruptura política e organizativa com esses partidos e sindicatos afiliados, que são cúmplices nas políticas que estão levando às mortes em massa. Isso surge da declaração reacionária, intitulada “Vamos construir a transição para o ecossocialismo agora”, publicada no mês passado por uma coalização de partidos pequeno-burgueses, que inclui o Novo Partido Anticapitalista (NPA) francês, os Anticapitalistas no governo do Podemos espanhol, a Aliança Vermelha e Verde (RGA) dinamarquesa, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) brasileiro, o Partido Nava Sama Samaja do Sri Lanka e o Ação Socialista dos EUA.
Apesar de se apresentar como “Secretariado Executivo da Quarta Internacional” (EBFI, na sigla em inglês), a sua hostilidade à classe trabalhadora e ao trotskismo - isto é, ao internacionalismo marxista - é praticamente evidente. Sua declaração mantém um silêncio ensurdecedor sobre a política reacionária de retorno ao trabalho, sobre a propaganda de guerra contra a China, sobre os obscenos resgates bancários realizados nos países imperialistas, e sobre os planos de demissões em massa e austeridade em meio ao colapso econômico provocado pela pandemia. Em vez disso, eles lançaram um ataque nacionalista, retrógrado contra as cadeias de abastecimento, que empregam centenas de milhões de trabalhadores e que transportam alimentos e medicamentos para bilhões em todo o mundo:
A COVID-19 é uma pandemia do neoliberalismo, um produto desta fase globalizada do capitalismo. O capitalismo, impulsionado pela globalização neoliberal, extendeu-se sobre todo o planeta. As cadeias produtivas globais, que são organizadas para as corporações aumentarem os seus lucros, tornam cada país vulnerável à menor crise, e a hipermobilidade que as sustenta eliminou qualquer mecanismo de saúde e segurança ecológica. Uma relação predatória com a natureza, baseada no uso de combustíveis fósseis e na agricultura capitalista em larga escala, com seus desertos verdes, que destrói tanto o equilíbrio dos ciclos fundamentais do Sistema Terra (carbono, água, nitrogênio) quanto a relação do ser humano com a biosfera, com a teia de vida da qual somos apenas uma parte.
A declaração de que a pandemia de COVID-19 é um castigo pela globalização e pela relação imoral da indústria com a natureza é uma mentira. O coronavírus SARS-CoV-2 causou a pandemia, mas a responsabilidade pela sua escala e impacto é dos governos capitalistas, principalmente os centros imperialistas dos EUA e da Europa. Eles não financiaram imediatamente as políticas de abrigo, mas, ao invés disso, entregaram resgates de trilhões de dólares e euros aos bancos, resultando em centenas de milhares de mortes e uma disseminação maior do vírus. O retorno prematuro ao trabalho vai custar outras milhares de vidas.
A indústria e a ciência internacionais não são as causas da pandemia, mas ferramentas que a classe trabalhadora pode utilizar para combatê-la. As viagens internacionais aumentaram muito a partir dos anos 1970 e o surgimento da produção industrial transnacional foi possível graças aos avanços na tecnologia dos computadores, dos contêineres e do transporte. Isso acelera a propagação inicial de doenças. Entretanto, é absurdo concluir a partir disso que a globalização causa pandemias. Um vírus altamente contagioso como o SARS-CoV-2 se disseminaria internacionalmente com ou sem o transporte e o comércio modernos. Em 1918, na Idade Média e mesmo durante o Império Romano, as pandemias de varíola, gripe, cólera e da peste negra se disseminaram internacionalmente, matando milhões.
Em comparação a esses períodos anteriores, a tecnologia do século XXI oferece enorme capacidade científica e industrial à humanidade para ser mobilizada contra a pandemia. Em algumas semanas, equipes internacionais de cientistas identificaram o vírus SARS-CoV-2, publicaram seu genoma e forneceram testes de diagnóstico da COVID-19. As maneiras como o vírus é transmitido foram identificadas. A globalização da indústria também significa que dezenas de países podem produzir equipamento de proteção, respiradores e medicamentos que, antes, teriam sido difíceis de produzir em massa fora dos centros imperialistas. Bilhões de trabalhadores esperam e exigem legitimamente que tais recursos sejam aproveitados para combater a pandemia.
Ao colocar direta e urgentemente a tarefa de utilizar os recursos econômicos para satisfazer as necessidades sociais, a pandemia pôs à prova a ordem social existente. O capitalismo, cuja economia é organizada baseada no lucro privado ao invés das necessidades sociais, fracassou miseravelmente. Já se sabia nos círculos da classe dominante, por aproximadamente duas décadas, desde a epidemia de SARS de 2002, que uma pandemia desse tipo era um risco. Mesmo assim, esforços por vacinas e tratamentos para o coronavírus foram subfinanciados e abandonados em grande parte. Neste ano, mesmo em países ricos, testes, respiradores e equipamento de proteção não estavam prontos para a população. Mesmo as máscaras muitas vezes não estavam disponíveis, inclusive para o pessoal médico na linha de frente da luta.
Outra falha crítica do capitalismo certamente é o fato de que o seu desenvolvimento da forças produtivas prejudica o meio ambiente. O agronegócio tem exposto esse fato de maneira devastadora e a queima de combustíveis fósseis para gerar energia tem provocado aquecimento global sem precedentes. Entretanto, esses são problemas globais, que exigem a mobilização de recursos científicos e industriais para produzir alimentos saudáveis, eliminar a poluição e impedir o aquecimento global. Tais problemas não podem ser resolvidos com chamados pela volta ao passado para a era anterior à globalização, pelo fim da agricultura em larga escala ou pelo confinamento das trocas econômicas dentro das fronteiras do estado-nação.
A força que pode ser mobilizada para usar a indústria global de uma maneira planejada e científica é a classe trabalhadora internacional. Ao organizarem comitês de ação, independentes dos sindicatos nos seus locais de trabalho e através das redes sociais, os trabalhadores podem não somente garantir a segurança nos locais de trabalho, mas também tomar o controle da indústria e utilizá-la para iniciar uma luta global contra o vírus que não seja baseada no lucro, mas na ciência médica. Entretanto, isso significa uma luta internacional para expropriar a aristocracia financeira, a tomada do poder de estado e a construção do socialismo. Isso exige, em particular, uma ruptura política consciente com as camadas reacionárias de acadêmicos de classe média, sindicalistas e membros da mídia representadas pelo EBFI.
O “ecossocialismo” do EBFI é apenas uma fachada ambientalista desenhada para encobrir o seu apoio aos resgates bancários e outras políticas direitistas da classe dominante. Sua declaração diz: “Nessa situação, a grande maioria dos governos foi forçada a adotar medidas extremas. Nós devemos defender medidas que ataquem a forma e a substância do neoliberalismo e do sistema capitalista”. Mesmo enquanto demissões em massa estão sendo preparadas, a declaração ataca a indústria, dizendo: “A crise atual mostra claramente que uma parte significativa da produção capitalista é puramente predatória, totalmente supérflua e de desperdício”. O texto acrescenta: “um reajuste industrial massivo pode ser realizado em um prazo relativamente curto, dependendo da vontade política”.
Esses charlatões insinuam que os resgates e o pagamento do seguro desemprego pelos governos capitalistas atacam a substância do capitalismo. Eles declaram que a pandemia “mostra que a redução significativa das horas de trabalho mantém a produção de bens essenciais e que as garantias de salário e de renda e o acesso universal à saúde e educação são totalmente viáveis em um regime de transição, em que a produção de energia e os sistemas produtivos sejam totalmente substituídos e enormes contingentes de trabalhadores sejam deslocados para diferentes setores da economia compatíveis com uma transição ecossocialista...”.
Que fraude! A pandemia não demonstrou que a ordem existente é capaz de uma mudança progressista, mas a sua falência, a sua desumanidade e a necessidade de ser derrubada.
Ao invés de garantir acesso universal à saúde e à assistência social, os governos capitalistas deixaram milhões em casa sem cuidados, negando tratamento decisivo para os idosos com base no critério bárbaro de idade e agora estão forçando os trabalhadores a retornarem ao trabalho em meio à pandemia. Em países europeus ricos, mesmo enquanto trilhões de euros são gastos em resgates bancários, os trabalhadores sobrevivem com benefícios miseráveis e milhões passam fome ou dependem de caridade em bairros de classe trabalhadora das grandes cidades. Internacionalmente, 250 milhões de pessoas correm o risco de morrer de fome devido à interrupção na agricultura e no comércio globais e centenas de milhões de trabalhadores estão sob risco de perder os seus empregos.
A pandemia expôs o ecossocialismo do EBFI e uma série de grupos de pseudo-esquerda similares. O ecossocialismo explora as questões ambientais para repudiar a política de classe, o socialismo e o marxismo. Se ele ainda é promovido fraudulentamente como uma estratégia “anticapitalista” por grupos pequeno-burgueses, antimarxistas, isso não tem qualquer relação com a política de esquerda, muito menos socialista ou de classe trabalhadora.
Há mais de meio século, os ancestrais políticos do EBFI romperam com o trotskismo e se separaram do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) em 1953. Liderados por Michel Pablo e Ernest Mandel, eles exigiram que a Quarta Internacional fosse politicamente dissolvida dentro dos partidos stalinistas e nacionalistas burgueses que haviam dominado os movimentos revolucionários massivos dos anos 1940 contra o fascismo e o colonialismo. Através desses partidos - que haviam bloqueado a tomada do poder pela classe trabalhadora e, desse modo, preservado o domínio capitalista em partes decisivas da Europa, África e Ásia após a Segunda Guerra Mundial - os pablistas se adaptaram à estrutura capitalista pós-guerra.
A rejeição dos pablistas da luta da classe trabalhadora pelo poder atraiu um seguimento entre camadas pequeno-burguesas do movimento de juventude dos anos 1960 que surgiu no movimento contra a Guerra do Vietnã e no período anterior à greve geral de 1968 na França. As figuras líderes nos partidos do EBFI são, em grande parte, membros dessa geração, recrutados para o movimento pablista com base nas políticas identitárias de gênero, racial e étnica. Essa visão de mundo também trouxe os pablistas para um alinhamento com os intelectuais pequeno-burgueses antimarxistas desenvolvendo diversas formas de política ambiental.
Essas concepções foram enunciadas em um trabalho de 1964, “A estratégia dos trabalhadores e o neocapitalismo”, por André Gorz. Um pós-modernista franco-austríaco que, em 1980, publicou um ataque ao marxismo intitulado “Adeus ao proletariado”, Gorz foi um defensor da ecologia política. Ele escreveu que “de dentro do sistema capitalista” a esquerda deveria fazer propostas “para transformar radicalmente a sociedade... com reformas estruturais”, como na política ambiental. Ao mesmo tempo em que defendia abertamente reformas sob o capitalismo, Gorz afirmou que essas medidas eram revolucionárias ou até mesmo socialistas. “não é necessariamente reformista... não exigir reformas com base no que é possível dentro de um dado sistema social ou administrativo, mas no que pode ser tornado possível dadas as necessidades e demandas humanas”.
Gorz estava criando uma forma de cinismo político teoricamente consciente: enquanto apoia a continuação do governo capitalista, ele propôs demandas que admitiu serem impossíveis dentro dessa ordem social. Ele chamou ambiguamente a sua teoria de “uma estratégia progressista pela tomada do poder pela classe trabalhadora que não descarta a possibilidade, ou talvez a necessidade de uma tomada revolucionária do poder em uma etapa posterior”. Essa foi a maneira como Gorz sinalizou sua intenção de relegar a tomada revolucionária do poder pela classe trabalhadora a um futuro distante e indefinido. Na prática, isso signifcou uma abertura para vários partidos burgueses ou pequeno-burgueses encobrirem a sua política reacionária colocando demandas retóricas radicais sem ter qualquer intenção de lutar por elas.
Após 1968, tais escritas corruptas forneceram uma justificativa teórica para alianças entre as organizações pablistas e um conjunto de partidos burgueses recém-criados, como o Partido Socialista (PS) francês, criado em 1971, o Movimento Socialista pan-helênico (PASOK) criado em 1974 e o Partido dos Trabalhadores (PT) em 1980. Esses partidos burgueses prometeram políticas radicais, “socialistas” e ambientais para conquistar apoio e votos e então, uma vez no governo, sempre traíram essas políticas. Entretanto, apoiados por partidos stalinistas e pablistas, eles tiveram papéis de liderança na política burguesa por décadas.
Entretanto, após três décadas desde a dissolução stalinista da União Soviética em 1991, tornou-se impossível suprimir o antagonismo entre a classe trabalhadora e essa ordem política corrupta. A restauração do capitalismo na União Soviética pelo stalinismo confirmou os avisos do seu papel contrarrevolucionário por Leon Trotsky. Em meio à crescente revolta social e desilusão política entre os trabalhadores internacionalmente, os acontecimentos também confirmaram completamente a oposição sustentada em princípios do CIQI à política de pseudo-esquerda das organizações pablistas.
Em seu congresso fundador em 2009, o NPA renunciou formalmente até mesmo a um vínculo simbólico com o trotskismo e proclamou seus já estreitos e duradouros vínculos com o PS. Isso eliminou o último obstáculo ideológico a adoção entusiástica do NPA das políticas de direita. Um dos principais membros do NPA, François Sabado, respondeu ao obsceno resgate dos bancos europeus em 2009, após a quebra de Wall Street, chamando pela sua ampliação: 'Segundo o ganhador do Prêmio Nobel de Economia, Paul Krugman, o plano de Obama de um resgate de mais de 5% do PIB só vai lidar com metade do provável impacto da recessão... Sendo brando, os resgates europeus são subdimensionados: 1,3% do PIB na Grã-Bretanha, 1% na França, 0,8% na Alemanha, 0,1% na Itália.'
Sabado saudou os resgates de 2009 como 'mais intervenção do Estado na economia, para salvar bancos, pela concentração e reestruturação industrial e financeira'. É uma mudança em relação à política de livre mercado de ‘cada vez menos governo’ de Reagan e Thatcher'.
Na realidade, trilhões de dólares e euros entregues aos super-ricos foram um sinal para um ataque internacional à classe trabalhadora de agressividade sem precedentes. Internacionalmente, os partidos social-democratas e nacionalistas com os quais os partidos do EBFI haviam se aliado desabaram em meio à crescente revolta dos trabalhadores com as suas políticas de austeridade. O PASOK sofreu uma desintegração eleitoral em 2015, seguido pelo PS francês em 2017. O PT no Brasil foi expulso do poder em 2016 por uma operação de direita para mudança de regime, após o colapso de sua popularidade.
Desde então, a classe dominante tem integrado cada vez mais partidos de pseudo-esquerda, como aqueles do EBFI pablista, no aparato estatal para lançar a guerra e a austeridade contra os trabalhadores. Eles apoiaram a guerra da OTAN contra a Líbia em 2011, o armamento de grupos 'rebeldes' na Síria e a operação para mudança de regime liderada pela OTAN e a consequente guerra civil na Ucrânia em 2014. Em 2015, o EBFI saudou a eleição de seu aliado grego, o Syriza ('Coalizão da Esquerda Radical'), que impôs cortes sociais draconianos e montou massivos centros de detenção para refugiados. Os partidos do EBFI estão em dois governos de austeridade europeus: os Anticapitalistas espanhóis aderiram ao governo do Partido Socialista Espanhol com o Podemos, enquanto a RGA faz parte da coalizão parlamentar do governo dinamarquês.
O papel do EBFI em enaltecer e implementar políticas de direita o torna cada vez mais consciente de sua violenta hostilidade ao marxismo. Um dos estudantes recrutados pelo pablismo na França após a greve geral de 1968 foi o franco-brasileiro membro do NPA e co-autor de um 'Manifesto Ecossocialista' de 2001, o professor Michael Löwy. Em uma discussão sobre o ecossocialismo em uma entrevista de 2012 com a revista ex-stalinista Mouvements, Löwy respondeu: 'Claro que o ecossocialismo não se solidariza com os chamados socialismos do século XX, a social-democracia e o stalinismo. Ele também chama pelo questionamento e a crítica aos limites do marxismo'.
Entre o que ele viu como os 'limites' do marxismo, Löwy enfatizou sua concepção de uma crise revolucionária e da necessidade de uma revolução socialista decorrente do crescimento das forças produtivas da humanidade: 'O limite mais importante é o conceito de 'desenvolvimento das forças produtivas' e a idéia de que o socialismo deve suprimir as relações de produção capitalistas porque elas se tornaram 'obstáculos' ou ‘correntes' que impedem o seu desenvolvimento. O ecossocialismo rompe definitivamente com essa concepção'.
Löwy acrescentou que o seu ecossocialismo está ligado intimamente ao seu apoio ao 'anticapitalismo romântico'. Ele definiu isso como 'um protesto cultural contra a civilização moderna capitalista e industrial em nome de certos valores do passado. O romantismo protesta contra a mecanização, a racionalização instrumental, a reificação, a dissolução dos laços comunitários e a quantificação das relações sociais'.
A pandemia expôs a falência histórica dessas políticas retrógradas e pessimistas da pequena burguesia pró-imperialista. Por décadas, o risco de uma pandemia, a ameaça do aquecimento global e outros problemas ambientais urgentes eram conhecidos, mas praticamente nada foi feito; o custo em vidas apenas da pandemia de COVID-19 pode chegar facilmente aos milhões.
Na realidade, os problemas ambientais não podem ser resolvidos sem que, antes, a classe trabalhadora internacional tome o poder numa luta pelo socialismo contra o sistema de estados-nação capitalista. Entretanto, para travar tal luta, o movimento em desenvolvimento da classe trabalhadora internacional precisa ter um entendimento claro do abismo de classe que separa o marxismo revolucionário da política 'ecossocialista' das organizações pseudo-esquerdistas de classe média.
Antes da pandemia, já estava ocorrendo uma onda global sem precedentes de protestos e greves contra a desigualdade social. Em 2018, ocorreram massivas greves de professores em uma rebelião contra a burocracia sindical estadunidense e os protestos dos 'coletes amarelos' na França, organizados através das redes sociais. No ano passado, houve a primeira greve nacional de professores na Polônia desde que o regime stalinista restabeleceu o capitalismo em 1989, greves organizadas via redes sociais por enfermeiras portuguesas e protestos em massa no Sudão, Argélia, Líbano, Iraque, Equador, Bolívia, Chile e outros países. Acabou a época em que o impacto da restauração do capitalismo pelo regime stalinista na União Soviética era suficiente para suprimir a luta de classes e a luta pelo socialismo internacionais.
Hoje, a política de retorno ao trabalho em meio à pandemia está criando as condições para uma nova e poderosa luta mobilizando a classe trabalhadora internacionalmente. Em 2017, havia quase um bilhão de trabalhadores somente na indústria. Conforme as massas de agricultores em toda a Ásia e África viajavam para as cidades para encontrar emprego, as fileiras da classe trabalhadora cresceram 1,2 bilhão entre 1980 e 2010. A luta para estabelecer um plano racional e científico contra a pandemia une a classe trabalhadora atravessando as linhas raciais, nacionais e de gênero em oposição irreconciliável à aristocracia financeira.
Isso coloca a classe trabalhadora em conflito cada vez mais direto com os partidos do EBFI. Eles não apoiam, mas temem as lutas dos trabalhadores - o que se reflete no fato de o NPA francês ter inicialmente atacado os 'coletes amarelos' como 'multidões de extrema-direita'. Desse modo, quando o EBFI propõe um movimento, ele exclui a classe trabalhadora e omite qualquer tipo de luta na indústria ou para tomar o poder político. Ao invés disso, ele enaltece iniciativas de 'movimentos das mulheres, jovens e ambientalistas', afirma:
Há exemplos dessas iniciativas pela população ou por setores organizados, como os camponeses, povos indígenas, desempregados e comunidades da periferia das grandes cidades, as redes de solidariedade feminista, entre outros. Essas iniciativas estão forjando alternativas muito interessantes, como a fabricação coletiva de máscaras de pano para doar à população a fim de garantir a prevenção do contágio, a doação e produção alternativa de alimentos, a defesa da saúde pública e a exigência do seu acesso universal, a exigência da garantia dos direitos trabalhistas e o pagamento de salários, a denúncia do aumento da escalada da violência contra as mulheres e o trabalho doméstico árduo feito por elas durante o isolamento em casa, entre outras.
Tais políticas - a mobilização de confederações camponesas, organizações baseadas na identidade racial ou étnica, e grupos feministas, como substitutos da classe trabalhadora - são inadequadas para lidar com a pandemia. Por que os trabalhadores deveriam implorar por doações de alimentos 'alternativos', quando é a classe trabalhadora que transporta, processa e comercializa alimentos na principal cadeia produtiva industrial de alimentos? Como a austeridade da burguesia e o seu impacto devastador na saúde pública em todo o mundo pode ser impedida apenas pelos movimentos locais de grupos camponeses, indígenas e de mulheres? Por que a população deveria se satisfazer com máscaras de pano feitas à mão, quando máscaras mais seguras e eficazes e outros equipamentos de proteção podem ser fabricados de forma mais eficiente nas fábricas?
Se os agentes políticos que dirigem o EBFI fossem honestos em sua resposta, eles diriam: A população deve aceitar máscaras feitas à mão para que as fábricas possam ficar sob o controle dos bancos e da classe dominante, e para que os dividendos das ações continuem entrando em nossos próprios portifólios de ações. Se isso custar milhões de vidas, eles acrescentariam, que assim seja.
A ameaça a bilhões de vidas pela pandemia revelou o conflito irreconciliável entre os interesses dos trabalhadores e aqueles representados pela pseudo-esquerda pequeno-burguesa. Esse conflito está na base da defesa ao longo de décadas e sustentada em princípios do CIQI das tradições da Revolução de Outubro e do trotskismo contra organizações como o EBFI.
A questão decisiva que a classe trabalhadora internacional enfrenta ao entrar em luta é a garantia da sua independência política em relação a essas forças de classe média. Ao verem os trabalhadores construírem comitês de segurança, comitês de ação e outras organizações de luta fora do controle das burocracias sindicais, elas vão procurar intervir. Porém, será para dividir o movimento e vinculá-lo ao sistema capitalista de estados-nação. A alternativa revolucionária para os trabalhadores que buscam defender as suas vidas, condições de vida e as suas organizações de luta é a defesa do internacionalismo marxista do CIQI contra a pseudo-esquerda.