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Presidente peruano, Castillo, sofre impeachment e é preso após tentar dissolver Congresso

Publicado originalmente em 8 de dezembro de 2022

O presidente eleito do Peru, Pedro Castillo, foi preso na quinta-feira após uma série de eventos extraordinários no dia anterior. Buscando desesperadamente prevenir as ameaças dos poderes judicial e legislativo de derrubá-lo do poder, ele ordenou o fechamento do Congresso e declarou um estado de exceção autoritário.

A tentativa de Castillo de permanecer no poder colapsou depois que os comandos das forças armadas e da polícia emitiram uma declaração conjunta descrevendo suas ações como inconstitucionais e anunciando que não as apoiariam.

Castillo marcha em frente à polícia e militares em Pampachiri, região de Apurímac no Peru, em 26 de novembro. [Foto: @PedroCastilloTe] [Photo: @PedroCastilloTe]

O Congresso desafiou sua ordem de dissolução e, em vez disso, votou em maioria esmagadora por seu impeachment. Vários de seus ministros renunciaram imediatamente e condenaram suas ações como uma tentativa de “golpe”, e dentro de horas o Congresso nomeou sua vice-presidente, Dina Boluarte, como sucessora de Castillo.

A humilhante queda de Castillo, ex-professor rural e líder sindical, expôs completamente não apenas a falência de seu próprio governo, mas a da política de amplos setores da pseudoesquerda que celebraram sua eleição como uma vitória do “socialismo”. Diante da oposição intransigente dos militares e da direita política, ele se mostrou incapaz e indisposto a sequer tentar a mobilização de qualquer apoio popular.

À parte de seu destino pessoal, os acontecimentos no Peru apontam a uma guinada acentuada das classes dominantes em toda a América Latina à ditadura, na medida em que procuram colocar todo o fardo da profunda crise econômica sobre os ombros dos trabalhadores e das massas rurais.

A crise atual do governo burguês no Peru, que viu seis presidentes em pouco mais de quatro anos, bem como a detenção e prisão de todos os chefes de estado vivos sob acusações de corrupção, atingiu um novo nível de intensidade.

Um incógnito político antes de se unir a Castillo em 2021, Boluarte não tem nenhum apoio popular ou um partido. Embora tivesse declarado anteriormente que renunciaria se Castillo fosse destituído, ela rapidamente mudou de tom assim que isso ocorreu. As congratulações imediatas do Departamento de Estado dos EUA e da União Europeia, assim como os esforços da mídia corporativa para promovê-la como a primeira mulher presidente do país, já desmoronam em meio a manobras da direita para destituir ela também e forçar eleições antecipadas.

Reconhecendo sua posição precária, Boluarte apelou em seu discurso inaugural para uma “trégua política para instalar um governo de unidade nacional” e para “um amplo diálogo entre todas as forças políticas representadas ou não no Congresso”. Em outras palavras, ela oferece seus serviços como laranja em um governo dominado pela direita.

A oposição de extrema-direita no Congresso, no entanto, dificilmente aceitará a oferta. A oposição já havia tentado destitui-la quase tão violentamente quanto Castillo, com o objetivo de instalar o presidente do Congresso, José Williams, o próximo na linha de sucessão. Williams é um ex-oficial militar fascistoide que ataca sistematicamente a “ideologia marxista” e foi acusado de ligações com cartéis de drogas e de tentar encobrir o massacre de 1985 de 69 camponeses em Accomarca.

Na madrugada de quinta-feira, o Ministério Público cumpriu um mandato de busca e apreensão nos escritórios presidenciais e ministeriais para reunir provas contra Castillo, e potencialmente também contra Boluarte.

Desde que tomou posse em julho de 2021, Castillo nomeou cinco gabinetes diferentes e 80 ministros, enfrentou dois impeachments fracassados pelo Congresso unicameral e rompeu com seu partido, Peru Livre. Ele rumou consistentemente para a direita, inclusive por meio de suas nomeações, o que só incentivou a extrema direita e suas alegações de corrupção e nepotismo.

O fato é que todo o establishment político, incluindo a polícia e os militares, foram completamente desacreditados. As acusações contra Castillo eram mínimas se comparadas à vasta rede de corrupção que envolve todas as instituições do Estado.

Uma pesquisa de dados publicada horas antes da audiência do impeachment concluiu que a ridícula taxa de aprovação de Castillo, de 24%, era maior do que os 11% de aprovação do Congresso.

A tentativa de Castillo de preventivamente impedir seu impeachment naufragou assim que a polícia e os comandos militares, juntamente com seus mentores em Washington, se recusaram a apoiá-lo. A embaixadora americana, Lisa Kenna, rapidamente condenou a declaração de Castillo na quarta-feira e o convocou a “recuar de sua tentativa de fechar o Congresso”. Apreensivamente, ela acrescentou: “Nós encorajamos o público peruano a manter a calma durante estes tempos incertos”.

Castillo reagiu tentando a fuga. Tendo conseguido uma oferta de asilo do presidente mexicano Andrés Manuel López, ele e toda sua família rumaram de limusine à Embaixada do México em Lima até que o chefe da segurança nacional ordenasse que a escolta de Castillo o levasse à sede da polícia de Lima. Lá ele foi preso por “rebelião” e “quebra da ordem constitucional” e enviado à prisão sob uma ordem de detenção preventiva.

O Congresso pôde então fazer avançar seu debate de impeachment e rapidamente votar por uma maioria de 101 dos 130 membros por sua deposição por “incapacidade moral permanente”.

Antes da tentativa de Castillo de dissolver o Congresso, entretanto, todas as reportagens sugeriam que os partidos de extrema-direita ainda estavam muito atrás dos 87 votos necessários para depô-lo, tendo conseguido apenas 55 votos na última tentativa em março.

Ao mesmo tempo, partidos do centro oficial, como Aliança para o Progresso, Ação Popular e o Partido Morado tinham gradualmente aderido à campanha pelo impeachment, mesmo após a extrema-direita recorrer a alegações surpreendentemente reacionárias de “traição à pátria” contra Castillo por somente considerar auxiliar a Bolívia a ter uma saída para o mar.

Longe de defensores da democracia como a mídia agora alega, a polícia e os militares são parte do mesmo aparato estatal repressivo com um longo histórico de repressão brutal a protestos pacíficos e massacres de camponeses e trabalhadores. Apenas dois anos atrás, a polícia matou Inti Sotelo e Brian Pintado durante uma manifestação contra Manuel Merino, cuja presidência durou apenas seis dias.

O governo Biden continuou a treinar e armar essas forças, preparando uma maior repressão mais poderosa. Em agosto, o governo Castillo e o Congresso aprovaram a entrada das tropas americanas para exercícios conjuntos com as forças militares e policiais peruanas envolvendo operações especiais de combate, apoio de inteligência e operações psicológicas.

Castillo não voltou seus apelos contra a extrema-direita à classe trabalhadora, mas ao imperialismo norte-americano, enviando uma carta no mês passado à Organização dos Estados Americanos (OEA), uma agência cúmplice em numerosos golpes de Estado apoiados pela CIA. Ele implorou a este órgão dominado pelos EUA que o defendesse contra um “novo tipo de golpe de estado”.

No início de seu mandato, Castillo – como os presidentes pseudoesquerdistas Petro na Colômbia e Boric no Chile – procurou se acomodar a Washington denunciando o governo Nicolas Maduro na Venezuela como antidemocrático. Este ano, após uma reunião em outubro em Lima com o Secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, o governo Castillo assinou uma represália conjunta à operação militar russa na Ucrânia.

Em 1º de dezembro, a partir de Washington, os enviados da OEA recomendaram uma “trégua política” após advertir que as ações de ambas as facções governantes, incluindo as investigações de corrupção contra Castillo e suas ameaças de dissolver o Congresso, “põem em risco o institucionalismo democrático do Peru”. A conclusão da OEA foi interpretada como uma recusa em apoiar Castillo e uma luz verde para a direita para prosseguir com sua derrubada.

Castillo combinou um programa de direita de deportações em massa de migrantes, retratando-os constantemente como criminosos, e a suspensão de praticamente todas as medidas de mitigação da COVID-19 – a despeito de o Peru ter sofrido a maior taxa de mortalidade per capita do mundo – com slogans demagógicos como “Basta de pobres em um país rico”. Mas a única redistribuição de renda que ele implementou foi para o andar de cima, através de auxílios e outros incentivos às empresas, alegadamente para reduzir o desemprego.

Este ano, ele vangloriou-se de suas políticas terem reduzido drasticamente a pobreza. Entretanto, mesmo as reaberturas inseguras da economia reduziram apenas ligeiramente o número de pessoas na pobreza, de 9,93 milhões para 8,61 milhões durante seu primeiro ano, comparado a 6,6 milhões antes da pandemia.

Toda a região foi gravemente afetada pelos problemas atuais nas cadeias de abastecimento global devido à pandemia, pelo aumento das taxas de juros pelos principais bancos centrais e pela guerra da OTAN contra a Rússia na Ucrânia. A dívida pública do Peru, que o país mantém principalmente em euros e dólares, saltou rapidamente de menos de 20% de seu PIB em 2013 para mais de 36%. Além disso, a agricultura do país é altamente dependente das importações de grãos e fertilizantes produzidos em grande parte na Rússia e na Ucrânia.

Durante a época de colheita deste ano, o governo Castillo fracassou três vezes ao tentar uma compra internacional de fertilizantes, o que foi explorado por aqueles que pressionavam pelo impeachment.

Estas pressões se somaram à contínua desvalorização do sol peruano em relação ao dólar desde 2014, quando terminou o boom das commodities. As vendas de cobre para a China, cuja demanda continua anêmica e cujos preços não acompanharam a inflação, são, de longe, a principal exportação do Peru, seguida do ouro e gás.

Com as economias do Peru e de toda a América Latina em grave declínio, a crise política em Lima sinaliza, acima de tudo, que as elites governantes serão incapazes de continuar suprimindo a luta de classes com a promoção de ilusões em uma “Maré Rosa” totalmente desbotada.

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