Publicado originalmente em 17 de julho de 2023
Enquanto amplos setores da pseudoesquerda abraçaram a guerra dos EUA-OTAN contra a Rússia na Ucrânia, grupos antitrotskistas como o Partido da Causa Operária (PCO) no Brasil estão procurando desviar a crescente oposição à guerra imperialista e opressão entre os trabalhadores e a juventude internacionalmente para o apoio falido ao nacionalismo burguês.
Apesar de terem sua atividade completamente voltada para a esfera política nacional, é na escolha de seus aliados internacionais que organizações como o PCO expõe de forma mais aberta seu caráter reacionário. A recente vitória de Recep Tayyip Erdoğan nas eleições presidenciais da Turquia foi entusiasticamente celebrada pelo PCO, que buscou apresentá-lo como um líder anti-imperialista e acobertar suas políticas autoritárias contra a classe trabalhadora turca e o povo curdo.
Em um editorial de seu portal Causa Operária, o PCO argumentou que a vitória de Erdoğan contra Kemal Kılıçdaroğlu, “um representante da política do imperialismo no país”, a tornava “um fato ainda mais importante para a luta dos oprimidos não só turcos, mas do mundo inteiro”. Atribuindo ao presidente turco a “predisposição a enfrentar a ditadura mundial do imperialismo”, o PCO declarou que “apesar de ser representante da direita turca, Erdoğan demonstra um alinhamento cada vez mais intenso com os países oprimidos e, sobretudo, com a Rússia, se afastando da política do imperialismo americano”.
Em um tuite publicado pelo PCO em 28 de maio, dia em que foram anunciados os resultados da eleição turca, o partido declarou: “Imperialismo é derrotado novamente. Em meio a uma gigantesca campanha, de caráter golpista, contra Erdoğan o atual presidente foi reeleito na Turquia. O imperialismo perde o controle do Oriente Médio”.
O tuite do PCO, que foi visualizado centenas de milhares de vezes, e recebeu várias respostas de apoio dos apoiadores de Erdoğan, é parte dos seus esforços para desviar uma verdadeira luta contra o imperialismo para os canais reacionários do nacionalismo.
Apesar de ser visto em Washington e nas capitais europeias, que não esconderam sua preferência por Kilicdaroglu, como insuficientemente agressivo na promoção dos seus interesses na região, Erdoğan está longe de ser um oponente do imperialismo e, muito menos, um defensor das populações vitimadas por suas guerras e interferências.
Em suas quase duas décadas no poder, Erdoğan colaborou estreitamente com as operações criminosas da OTAN, da qual a Turquia é membro, participando diretamente na guerra por procuração dos EUA contra a Síria, recebendo e reabastecendo caças e bombardeiros americanos em suas bases, e detendo refugiados das guerras imperialistas no Oriente Médio sob a política anti-imigrante da “Fortaleza Europeia”.
A verdade é que as políticas reacionárias de Erdoğan só não levaram à sua derrota nas eleições porque, em uma disputa que não apresentava qualquer alternativa real, o seu oponente oficial, Kılıçdaroğlu, mostrou-se um servil instrumento do imperialismo e um defensor aberto das forças da extrema direita turca. Kılıçdaroğlu declarou diversas vezes durante sua campanha que, se eleito, buscaria sem ressalvas os interesses da OTAN na guerra contra a Rússia, ao mesmo tempo sinalizando ao capital financeiro internacional em sua campanha ao mesmo tempo em que prometia brutal austeridade contra a classe trabalhadora.
Porém, isso não altera o fato de que Erdoğan, independentemente de sua retórica, também é uma política de direita a serviço do imperialismo e da burguesia turca contra a classe trabalhadora.
Ele mostrou que é plenamente capaz de promover os interesses imperialistas, desobstruindo o último obstáculo para a adesão da Finlândia na OTAN em março em meio à ofensiva cada vez mais aberta da aliança militar contra a Rússia.
Em 29 de maio, Joe Biden, o maior representante do imperialismo mundial, parabenizou a vitória eleitoral de seu suposto oponente, e declarou: “ele ainda quer trabalhar entorno dos F-16. Eu disse que quero um acordo envolvendo a Suécia, então vamos resolver isso”. Em meio aos preparativos dos EUA e potências europeias para enviar os caças aos militares ucranianos, Erdoğan estava utilizando seu veto sobre a entrada da Suécia na OTAN como uma barganha por concessões dos EUA.
As manobras pragmáticas de Erdoğan em relação ao conflito na Ucrânia – aquilo que, segundo o PCO, torna ele um lutador contra o imperialismo – são uma expressão do impasse da burguesia turca, presa entre as longas ligações estratégias e militares com os EUA e as potências europeias, por um lado, e as suas ligações econômicas com a Rússia, pelo outro.
Na medida em que a elite dominante enxerga na guerra atual imensos ônus e poucas vantagens, Erdoğan buscou uma política de equilíbrio entre Washington e Moscou. Sob as crescentes pressões exercidas pela intensa escalada da guerra da OTAN liderada pelos EUA contra a Rússia, a sua aprovação da Finlândia, Suécia assim como da Ucrânia como membros da OTAN mostram que essa política se tornou cada vez mais insustentável.
As manobras políticas falidas e a lógica dos interesses burgueses que Erdoğan defende o levaram a declarar no início deste mês que “Sem dúvida, a Ucrânia merece estar na OTAN”, ao mesmo tempo em que se declarou a favor da entrada da Suécia na OTAN. Isso expõe completamente as declarações do PCO de que este representante de décadas da elite turca é um oponente da agressão imperialista.
Contudo, o principal temor de Erdoğan é de que a guerra e suas privações impulsionem a revolta da classe trabalhadora contra o domínio da burguesia turca. Ele recorreu a métodos cada vez mais autoritários em resposta ao enorme aumento das greves dos trabalhadores turcos desde o ano passado, impulsionadas pela inflação e uma crise social que só irá se intensificar. Presidindo uma transferência histórica de riqueza dos trabalhadores para o capital financeiro, particularmente desde o início da pandemia de COVID-19, o seu governo acaba de anunciar um brutal programa de austeridade social.
Grupos nacionalistas como o PCO estão dispostos a dar cobertura aos ataques capitalistas e medidas autoritárias de Erdoğan pois não se orientam politicamente à classe trabalhadora turca, e sim à sua burguesia nacional. A premissa de suas declarações é que países como a Turquia, que possuem uma posição global análoga à do Brasil, são capazes de construir uma via alternativa ao imperialismo através da afirmação de seus interesses capitalistas nacionais.
Segundo essa visão, o processo em curso por trás da guerra atual, que começou na Ucrânia contra a Rússia e que avança contra a China, não é uma redivisão do mundo entre as potências imperialistas. Grupos como o PCO assumem que esse conflito abre o caminho para as chamadas “economias em ascensão” para que finalmente rompam as amarras do imperialismo e superem seus status de nações oprimidas.
Quaisquer que sejam suas declarações retóricas de defender os “povos oprimidos”, ao identificar os interesses das massas exploradas nesses países com aqueles das suas classes dominantes, as políticas do PCO legitimam a supressão de qualquer movimento da classe trabalhadora por chocar-se com os “interesses nacionais” burgueses. Isso é o que está fundamentalmente por trás do apoio do PCO a Erdoğan e todos os grupos que o partido chama de “anti-imperialistas”.
Além do próprio Erdoğan e do governo de Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil, o PCO entregou seu apoio político ao reacionário regime do Taliban no Afeganistão que tomou o controle após a retirada militar dos EUA, o regime iraniano que respondeu aos protestos em massa durante meses com prisões, força letal e execuções, e o regime oligárquico de Putin na Rússia que levou adiante a reacionária invasão da Ucrânia.
As declarações do PCO atribuindo credenciais anti-imperialistas para esses regimes são completamente alinhadas à sua política no próprio Brasil. Após seis meses em que o governo Lula aprovou medidas de austeridade, descartou qualquer resposta séria à pandemia de COVID-19, e atacou os direitos democráticos básicos, o PCO está tomando a dianteira em sua defesa, denunciando histericamente toda oposição às suas políticas como o trabalho de “golpistas” e colaboradores de Bolsonaro e das forças da ultradireita. Apesar dos ataques do PCO serem direcionados às disputas com outros agrupamentos pseudoesquerdistas, eles sinalizam o apoio resoluto que o partido irá dar à Lula conforme as políticas do PT confrontarem a oposição da classe trabalhadora.
Os apoiadores brasileiros e turcos (Grupos Socialistas pela Igualdade) do Comitê Internacional da Quarta Internacional rejeitam as ilusões reacionárias promovidas por organizações como o PCO em relação aos políticos burgueses pró-imperialistas como Lula ou Erdoğan, e defendem uma perspectiva política independente para a classe trabalhadora baseada em um programa socialista internacional.
Todos aqueles que buscam uma luta real contra a guerra imperialista e o estado capitalista não irão encontrar nada que faça avançar essa luta na política reacionária do PCO. Somente o Comitê Internacional da Quarta Internacional e suas seções nacionais afiliadas se opuseram consistentemente à guerra imperialista dos EUA e da OTAN contra a Rússia na Ucrânia desde o início, e lutaram para unificar os trabalhadores na Ucrânia, Rússia e todos os países independentemente do imperialismo e do nacionalismo russo. Apenas eles procuram basear a luta contra a guerra na mobilização independente e internacional da classe trabalhadora na luta pelo socialismo. Essa é a organização para a qual os trabalhadores e a juventude devem se voltar neste momento crítico.