Em 7 de outubro de 2018, David North, presidente do Conselho Editorial Internacional do World Socialist Web Site, deu a seguinte palestra em um comício com grande participação em Colombo, organizado pelo Partido Socialista pela Igualdade (SEP) no Sri Lanka. O encontro, que foi o segundo realizado no Sri Lanka, foi organizado para comemorar os 80 anos da Quarta Internacional e os 50 anos do SEP no Sri Lanka.
É um prazer e uma honra ter a oportunidade de dar uma palestra no Sri Lanka sobre a história da Quarta Internacional. O papel heróico desempenhado pelos socialistas revolucionários no Ceilão nos primeiros anos da Quarta Internacional é conhecido pelos trotskistas de todo o mundo. Diante das imensas dificuldades, os trotskistas pioneiros que fundaram o Partido Lanka Sama Samaja (LSSP) em 1935, e mais tarde, em 1942, o Partido Bolchevique-Leninista da Índia (BLPI), opuseram-se aos agentes políticos do imperialismo na burguesia nacional indiana e no Ceilão. A sua perspectiva política se baseava na teoria da revolução permanente, que havia sido elaborada por Leon Trotsky na primeira década do século XX, e que forneceu a estratégia política que guiou a classe trabalhadora russa à vitória em 1917.
Em 1939, Trotsky publicou uma carta dirigida aos trabalhadores da Índia. Com o seu característico domínio da história e da dinâmica da luta de classes, Trotsky resumiu as questões estratégicas essenciais diante das massas do subcontinente indiano:
A burguesia indiana é incapaz de liderar uma luta revolucionária. Eles são intimamente ligados e dependentes do capitalismo britânico. Temem pelos seus próprios bens. Reagem com medo das massas. Procuram acordos com o imperialismo britânico, independentemente do custo, e desarmam as massas indianas com esperanças de reformas vindas de cima. O líder e profeta dessa burguesia é Gandhi. Um falso líder e um falso profeta!
Trotsky denunciou o papel traiçoeiro desempenhado pelo regime stalinista na União Soviética, que, sob a chamada “Frente Popular”, exigia a subordinação da classe trabalhadora à burguesia nacional. Trotsky escreveu:
Que afronta do povo! “Frente Popular” é apenas um novo nome para essa velha política, cuja essência reside na colaboração de classe, numa coalizão entre o proletariado e a burguesia. Em cada uma dessas coalizões, a direção acaba invariavelmente nas mãos da ala direita, ou seja, nas mãos da classe proprietária. A burguesia indiana, como já foi dito, quer uma negociação pacífica e não uma luta. A coalizão com a burguesia leva à renúncia do proletariado da luta revolucionária contra o imperialismo. A política de coalizão implica aguardar parado, contemporizar, cultivar falsas esperanças, envolver-se em manobras e intrigas vazias. Como resultado dessa política, instala-se inevitavelmente a desilusão entre as massas trabalhadoras, enquanto os camponeses viram as costas ao proletariado, e caem na apatia.
Os fundadores do LSSP atentaram a esse aviso, opuseram-se à burguesia nacional, e criaram um poderoso partido revolucionário da classe trabalhadora no Ceilão. Porém, em 1964, com trágicas consequências, o LSSP virou as costas aos seus princípios de fundação, e entrou em uma coalizão com o governo do SLFP de Madam Bandaranaike. Em luta contra essa “Grande Traição”, a Liga Comunista Revolucionária – a antecessora do Partido Socialista pela Igualdade, a seção do Comitê Internacional da Quarta Internacional no Sri Lanka – foi fundada em 1968. Durante meio século, a seção do Comitê Internacional no Sri Lanka levou adiante uma luta intransigente para superar o legado da traição de 1964. Porém, ao travar essa luta, a organização nunca esqueceu da grande contribuição inicial dos fundadores do BLPI e do LSSP à causa do socialismo revolucionário, não apenas no Sri Lanka, mas em todo o mundo.
A importância do estudo da história
As minhas palestras no Sri Lanka fazem parte de uma comemoração internacional do aniversário de 80 anos da fundação da Quarta Internacional. O movimento trotskista é, por necessidade, consciente da história. Na ausência de uma perspectiva fundamentada historicamente, a análise política desce ao nível das impressões ecleticamente selecionadas. A política séria – e a atividade revolucionária é a mais séria política – exige um método científico. Na navegação, existe um instrumento chamado sextante. A sua invenção permitiu ao capitão do navio estabelecer com precisão a sua posição medindo o ângulo entre o horizonte visível e um astro. No processo de navegação política, o partido revolucionário deve correlacionar o horizonte político visível com um ponto de referência histórico.
Said Gafurov, opositor político do Comitê Internacional – que também é um apoiador do governo Putin na Rússia – protestou recentemente contra a nossa denúncia dos crimes e traições cometidos pelos stalinistas. Por que não podemos simplesmente deixar o passado para trás, e encontrar formas de trabalhar com os herdeiros políticos de Stalin? Por que deixar que os crimes e traições do passado atrapalhem uma colaboração hoje? Afinal, diz o nosso adversário, Trotsky foi assassinado em 1940, há 78 anos; e Stalin morreu em 1953, há 65 anos. A União Soviética foi dissolvida em 1991, há 27 anos. Porque ainda é necessário recordar as referências de Trotsky ao “rio de sangue” que divide a Quarta Internacional dos stalinistas, que, no final da década de 1930, levaram adiante uma campanha de genocídio político contra os melhores representantes do marxismo revolucionário na União Soviética?
Gafurov declarou que “hoje, as discordâncias e contradições entre o trotskismo e o stalinismo têm apenas um caráter histórico, e não político”, que não são mais relevantes para o presente do que as discordâncias “entre Robespierre e Hébert ou Danton, que apenas interessam aos historiadores”. O nosso oponente afirma que essas discordâncias “são importantes de serem estudadas, mas apenas pelas suas lições históricas (e a história, para ser honesto e ligeiramente cínico, nunca ensina nada a ninguém”).
O argumento apresentado pelo nosso oponente é que a história e a política existem em esferas diferentes e não estão relacionadas. O estudo da história pode ser de algum interesse intelectual abstrato. Porém, ela não nos ensina nada que seja de especial valor para a nossa atividade política prática atualmente. Aqueles que argumentam dessa forma não têm absolutamente nada em comum com a política marxista. O movimento revolucionário desenvolve o seu programa e atividade através da contínua reelaboração crítica da experiência histórica. Sem um ponto de referência histórico, é impossível navegar nas águas turbulentas da luta de classes. Além disso, como um partido revolucionário poderia formar os seus jovens quadros, e a classe trabalhadora como um todo, sem estudar os enormes acontecimentos revolucionários do século passado?
O século XX foi o mais revolucionário da história. Em todos os continentes, as massas oprimidas foram arrastadas para a luta contra o capitalismo e o imperialismo. Em 1917, o século testemunhou pela primeira vez na história a conquista do poder político pela classe trabalhadora, sob a liderança do Partido Bolchevique. Os partidos comunistas de massas surgiram em todo o mundo, refletindo o desejo e a determinação da classe trabalhadora em pôr fim ao capitalismo e estabelecer uma sociedade socialista.
No entanto, ao fim do século, apesar de todas as lutas e sacrifícios, a classe capitalista detinha o poder em todo o mundo. A União Soviética, que surgiu da revolução de 1917, havia sido dissolvida pelo seu próprio governo. Na China, o Partido Comunista, no poder, tornou-se o mais feroz defensor da economia capitalista. Vivemos hoje em um mundo de níveis espantosos de desigualdade social. Como se explica esse processo de retrocesso político?
Em todo o mundo, a indignação pelas condições existentes está aumentando. “Capitalismo” está novamente se tornando um palavrão. Há uma renovação do interesse pelo socialismo como alternativa à ordem social existente. Porém, isto deve ser dito sem rodeios, o que está claramente ausente nesse esforço progressivo é o conhecimento das grandes experiências políticas e das lutas revolucionárias do século passado. A própria palavra “revolução” carece de conteúdo significativo, em termos de uma compreensão dos seus fundamentos sociais, dinâmica de classe e estratégia política.
Os jovens, tendo nascido após a dissolução da União Soviética e a restauração do capitalismo na China, sabem pouco como esses eventos aconteceram, e não possuem um conhecimento detalhado sobre as histórias das revoluções russa e chinesa. Eles não estão familiarizados com o real conteúdo teórico e político de termos como stalinismo, maoísmo, ou castrismo. Claro que os jovens de todo o mundo estão familiarizados com a imagem romântica e evocativa de Che Guevara, mas não sabem nada sobre a sua estratégia e programa políticos – que foram, se me permitem a franqueza, completamente falidos.
O impacto dos ataques acadêmicos contra o marxismo
É claro que os jovens não são culpados pelo seu conhecimento limitado sobre as crises revolucionárias do século passado. Onde eles poderiam adquirir os conhecimentos necessários? A mídia capitalista certamente não fornecerá conhecimentos que possam contribuir para a derrubada da ordem social existente. Mas e quanto às universidades, com seus muitos professores eruditos? Infelizmente, há muitas décadas, o ambiente intelectual tem sido profundamente hostil à teoria e a política socialistas genuínas. A teoria marxista – enraizada no materialismo filosófico – foi banida das grandes universidades há muito tempo.
O discurso acadêmico é dominado pela pseudociência freudiana e pelo subjetivismo idealista da Escola de Frankfurt e pelos absurdos irracionalistas do pós-modernismo. Os professores informam a seus alunos que a “Grande Narrativa” do marxismo não possui relevância no mundo moderno. O que eles realmente querem dizer é que a concepção materialista da história, que estabeleceu o papel revolucionário central e decisivo da classe trabalhadora na sociedade capitalista, não pode e não deve ser a base da política de esquerda.
Não há necessidade de estudar a história das lutas revolucionárias do passado para os teóricos e praticantes da política de pseudoesquerda da classe média. As lições dessa história contradizem todas as suas idéias politicamente oportunistas e reacionárias. De fato, Trotsky é malvisto nesses círculos intelectuais. Porém, é impossível lutar pelo socialismo no século XXI sem estudar e assimilar as lições da luta de Trotsky contra o stalinismo no século XX. Essa permanece a luta teórica e política fundamental do século passado, da mais profunda e imediata importância para todas as questões decisivas de estratégia política diante dos trabalhadores e de todos aqueles que buscam seriamente o caminho correto de luta contra o capitalismo no mundo contemporâneo. Por isso, é necessário fazer um breve resumo das origens históricas e políticas da Quarta Internacional.
A importância da luta de Trotsky contra o stalinismo
A fundação da Quarta Internacional em setembro de 1938 é um marco decisivo na história do movimento trotskista, o auge político da luta que Leon Trotsky travou nos quinze anos anteriores – começando com a formação da Oposição de Esquerda na União Soviética em outubro de 1923 – contra a degeneração burocrática do partido comunista russo sob a liderança de Stalin.
As amplas implicações internacionais da luta de Trotsky contra o regime stalinista surgiram ao fim de 1924, quando Stalin promoveu a afirmação de que era possível construir o socialismo na União Soviética separadamente da luta internacional contra o sistema capitalista mundial, e sem a derrubada revolucionária bem-sucedida da classe dominante capitalista nos principais centros imperialistas na Europa Ocidental e na América do Norte.
O programa do “socialismo em um país” – uma ruptura fundamental com a estratégia internacionalista que baseou a conquista do poder pelo Partido Bolchevique e a posterior fundação da Internacional Comunista em 1919 – deu expressão política aos interesses da burocracia crescente dentro da União Soviética, cujos privilégios provinham da sua usurpação do poder político e da exploração em benefício próprio dos recursos da economia nacionalizada, criada após 1917. A ditadura totalitária estabelecida por Stalin – suprimindo violentamente marxistas revolucionários e empregando o terror policial como seu instrumento básico – foi o meio político pelo qual a burocracia defendeu seus privilégios e implementou a desigualdade social dentro da União Soviética.
A degeneração nacionalista do regime soviético encontrou seu impacto mais devastador na transformação da Internacional Comunista em um instrumento da política externa soviética. Procurando defender a orientação nacionalista implícita na teoria do socialismo em um país, a burocracia stalinista declarou que o socialismo poderia ser construído na URSS, desde que a intervenção militar das potências imperialistas fosse evitada. Assim, o objetivo da Internacional Comunista foi redirecionado para a busca e a manutenção de aliados externos, mesmo que a formação dessas alianças viesse em detrimento das lutas revolucionárias da classe trabalhadora nos países onde o regime stalinista buscava alianças com as forças burguesas e pequeno-burguesas.
A tragédia da Revolução Chinesa
As conseqüências políticas da subordinação da Internacional Comunista ao oportunismo nacional da burocracia soviética encontraram expressão trágica na China, onde Stalin insistiu que o Partido Comunista Chinês aceitasse a autoridade política do Kuomintang burguês e de seu líder, Chiang Kai-shek. Stalin chegou a ver Chiang como um aliado em potencial, e o retratou como um líder confiável da luta anti-imperialista na China. Stalin defendeu que a classe trabalhadora era obrigada a apoiar as seções progressivas da burguesia nacional. Trotsky rejeitou os esforços de Stalin para retratar a burguesia nacional em países com um desenvolvimento capitalista tardio como mais revolucionária do que a classe capitalista nos países avançados. Trotsky enfatizou que essa visão – em essência, um renascimento da posição dos mencheviques russos antes de 1917 – era baseada em uma falsa avaliação da dinâmica de classe nos países coloniais e semicoloniais. Ele escreveu:
O poderoso papel do capital estrangeiro na vida chinesa fez com que setores muito fortes da burguesia chinesa, da burocracia e dos militares unissem seu destino com aquele do imperialismo. Sem esse vínculo, o importante papel dos chamados “militaristas” na vida da China moderna seria inconcebível.
Seria ainda uma profunda ingenuidade acreditar que existe um abismo entre a chamada burguesia compradora, ou seja, a agência econômica e política do capital estrangeiro na China, e a chamada burguesia “nacional”. Não, essas duas seções estão incomparavelmente mais próximas entre si do que a burguesia e as massas de trabalhadores e camponeses.
A análise de Trotsky foi confirmada pelos acontecimentos. Em abril de 1927, Chiang levou adiante o massacre dos comunistas em Xangai e Cantão, desferindo um golpe do qual o Partido Comunista Chinês (PCC) nunca se recuperou. Após essa catástrofe, o PCC, sob a liderança de Mao Tse Tung, retirou-se das cidades e se mudou para o campo. Essa mudança alterou profundamente a composição e orientação de classe do PCC, que, a partir de 1927, baseou-se principalmente no campesinato rural, e não na classe trabalhadora urbana. A orientação maoísta provaria, nas décadas seguintes, ser uma fonte de grave desorientação política e erros estratégicos para as organizações que adotaram a orientação camponesa do PCC, incluindo o JVP aqui no Sri Lanka.
Apesar do desastre político na China, Trotsky continuou a lutar pela reforma do partido comunista soviético. Em 1928, Trotsky – que, em 1927, havia sido expulso do partido comunista russo e da Internacional Comunista – vivia no exílio em Alma Ata, uma cidade da Ásia Central soviética, perto da fronteira da China. Porém, mesmo no exílio remoto, a milhares de quilômetros de Moscou, Trotsky permaneceu um mestre da estratégia revolucionária. Ele obteve uma cópia do programa que havia sido elaborado por Nikolai Bukharin – então aliado de Stalin – como o principal documento do VI Congresso da Internacional Comunista, que se aproximava. Trotsky submeteu o documento baseado na teoria do socialismo em um país a uma crítica devastadora; e defendeu o internacionalismo revolucionário, a base da teoria da revolução permanente, como a orientação estratégica básica do movimento marxista. Ele escreveu:
Em nossa época, que é a época do imperialismo, ou seja, da economia mundial e da política mundial sob a hegemonia do capital financeiro, nem um único partido comunista pode estabelecer seu programa partindo única ou principalmente de condições e tendências de desenvolvimento em seu próprio país. Isso também vale inteiramente para o partido que exerce o poder estatal dentro das fronteiras da URSS. Em 4 de agosto de 1914 [o início da Primeira Guerra Mundial], o fim dos programas nacionais foi anunciado para todos os tempos. O partido revolucionário do proletariado só pode ser baseado em um programa internacional correspondente ao caráter da época atual, a época do maior desenvolvimento e colapso do capitalismo. Um programa comunista internacional não é em nenhum caso a soma total dos programas nacionais ou uma amálgama de suas características comuns.
Trotsky continuou:
O programa internacional deve partir diretamente de uma análise das condições e tendências da economia mundial e do sistema político mundial tomadas como um todo em todas as suas conexões e contradições, ou seja, com a interdependência mutuamente antagônica das suas partes separadas. Na época atual, em um grau muito maior do que no passado, a orientação nacional do proletariado somente deve e pode partir de uma orientação mundial e não vice-e-versa. Aqui reside a diferença básica e primária entre o internacionalismo comunista e todas as variedades do nacional-socialismo.
Mesmo após 90 anos, a análise de Trotsky sobre a dinâmica da revolução socialista, da primazia das condições internacionais sobre as nacionais, continua sendo o princípio estratégico essencial da luta pelo socialismo.
Como resultado fortuito de um erro burocrático, a Crítica ao Programa-Piloto de Trotsky foi traduzida para o inglês; e chegou acidentalmente aos delegados americano e canadense no VI Congresso, James P. Cannon e Maurice Spector. Eles contrabandearam o documento de Trotsky para fora da URSS. Isso levou à formação da Oposição de Esquerda Internacional. A luta contra a degeneração nacional stalinista do Partido Comunista da URSS foi expandida para uma luta contra a degeneração da Internacional Comunista.
Alemanha: “Decisiva para a situação internacional”
Entre 1928 e 1933, a Oposição de Esquerda Internacional se considerava uma fração da Internacional Comunista. As suas atividades eram dirigidas para a reorientação revolucionária da Internacional e dos partidos, dominados pelos stalinistas. Trotsky não estava disposto a abandonar a Internacional Comunista enquanto houvesse a possibilidade de provocar uma mudança nas suas políticas. Um fator importante nos cálculos políticos de Trotsky foi a crise na Alemanha, que ele descreveu como “decisiva para a situação internacional”.
Em Janeiro de 1929, Trotsky foi deportado da União Soviética para a ilha turca de Prinkipo, e passou a viver como um exilado apátrida no que chamou de “um planeta sem visto”. Entretanto, apesar do seu isolamento em uma ilha próxima da costa de Istambul, Trotsky desenvolveu uma análise extraordinariamente presciente da situação na Alemanha. Ele apelou à formação de uma frente única do Partido Comunista Alemão (KPD) e do Partido Social Democrata (SPD) contra a ameaça fascista.
O partido nazista havia se tornado um movimento de massas. Trotsky advertiu que, se chegasse ao poder, os resultados seriam uma catástrofe política para a classe trabalhadora internacional. Era preciso fazer tudo para bloquear a marcha dos nazistas ao poder, mas isso exigia uma mudança nas políticas imprudentes, totalmente desorientadas e inacreditavelmente estúpidas do KPD. Seguindo cegamente a linha estabelecida em Moscou, o KPD não apenas se recusou a formar uma frente única com o outro partido de trabalhadores de massas, o SPD, como também afirmou que ele – que ainda mantinha o apoio de milhões de trabalhadores – era uma organização “social-fascista”, praticamente idêntica aos nazistas. O KPD afirmou que, como não havia diferenças entre o SPD e os nazistas, nenhuma ação de defesa comum entre os dois partidos de trabalhadores de massas contra as forças de Hitler era permitida.
Conforme Trotsky havia alertado, as políticas do partido comunista abriram o caminho de Hitler para o poder. Com o apoio decisivo de políticos burgueses de alto escalão, Hitler se tornou chanceler da Alemanha em 30 de janeiro de 1933. O regime nazista agiu rapidamente para destruir – sem qualquer resistência organizada – as organizações de massas da classe trabalhadora. Apesar desse desastre político historicamente sem precedentes, o KPD – sem qualquer oposição no seio da Internacional Comunista – continuou a insistir que as suas políticas haviam sido corretas. A catástrofe alemã forçou Trotsky a alterar a sua abordagem em relação à luta contra o stalinismo. Ele concluiu que a reforma da Internacional Comunista era impossível. A Terceira Internacional estava morta como organização revolucionária. Era necessário construir a Quarta Internacional.
A fundação da Quarta Internacional por Trotsky
O chamado de Trotsky pela criação de uma Quarta Internacional estava ligado à sua avaliação do regime soviético. Ele concluiu que a reforma do regime burocrático era impossível. A burocracia havia se tornado uma força social contrarrevolucionária, defendendo os seus privilégios implacavelmente através da supressão da classe trabalhadora dentro da União Soviética; e traindo cinicamente as lutas da classe trabalhadora para além das fronteiras da URSS. A evolução da União Soviética para o socialismo exigia a derrubada do regime stalinista em uma revolução política. Somente através de um levante revolucionário da classe trabalhadora soviética e da derrubada da burocracia, seria possível restabelecer a democracia soviética e evitar a destruição da União Soviética e a reintrodução do capitalismo.
Os cinco anos entre o chamado de Trotsky pela formação da Quarta Internacional em 1933 e o congresso de fundação em 1938 estão entre os mais trágicos da história do movimento socialista. Apesar da crise sem precedentes do sistema capitalista mundial, a classe trabalhadora sofreu uma série de derrotas desastrosas. A causa das derrotas não foi a ausência da vontade de lutar. Ao contrário, os anos entre 1933 e 1938 testemunharam um imenso recrudescimento da luta de classes. Em 1936, a França viveu greves de caráter incipientemente revolucionário. Em maio e junho, houve mais de 12 mil greves envolvendo mais de dois milhões de trabalhadores, afetando praticamente todos os setores da indústria. As ações mais militantes envolveram a tomada das fábricas por trabalhadores de mentalidade revolucionária. Em julho de 1936, os trabalhadores espanhóis e catalães responderam a uma tentativa de golpe de Estado por generais fascistas, liderados por Francisco Franco, com um poderoso levante.
Porém, tanto na França como na Espanha, as vitórias iniciais da classe trabalhadora acabaram em desmoralização e derrota. O instrumento político das derrotas foi a “Frente Popular”, ou seja, a aliança dos partidos stalinistas e social-democratas e dos sindicatos com a burguesia. A base explícita dessa aliança era a defesa da propriedade capitalista contra as aspirações revolucionárias da classe trabalhadora. Os stalinistas insistiram que a luta contra o fascismo não consistia em nada além da defesa da democracia burguesa. A classe operária, insistiam os stalinistas, só poderia combater o fascismo em uma aliança com os setores democráticos liberais da classe capitalista. Portanto, era inadmissível avançar e lutar por um programa socialista, pois isso iria alienar os capitalistas democráticos e levá-los ao campo dos fascistas.
O significado contrarrevolucionário da Frente Popular encontrou a sua expressão mais acabada na Espanha, onde o partido stalinista, controlado por agentes da polícia secreta soviética, a GPU, perseguiu e assassinou aqueles que insistiram que a derrota de Franco exigia a mobilização da classe trabalhadora e do campesinato com base em um programa revolucionário. Os stalinistas asseguraram a vitória de Franco.
Enquanto Stalin levava a cabo a traição da classe operária para além das fronteiras da URSS, o seu “Grande Terror” no seio da União Soviética – com três julgamentos públicos em Moscou entre 1936 e 1938 – incluiu o extermínio físico de toda uma geração de revolucionários marxistas.
Essas foram as condições nas quais Trotsky fundou a Quarta Internacional. A sua insistência na necessidade de uma nova Internacional enfrentou a oposição daqueles que afirmavam que a sua condenação do regime stalinista era excessivamente intransigente e absoluta. Outra crítica era que o movimento trotskista era muito pequeno para estabelecer uma nova Internacional, e que, além disso, uma Internacional só poderia ser fundada com base em “grandes acontecimentos”.
Trotsky respondeu aos seus críticos insistindo que a fundação da Quarta Internacional se baseava, de fato, em “grandes acontecimentos”: as maiores derrotas da classe trabalhadora na história. Essas derrotas haviam exposto a traição e a inutilidade política das antigas organizações. Além disso, a questão decisiva não era a dimensão de um partido, mas a qualidade do seu programa – isto é, se o programa promovido pela Quarta Internacional se baseava ou não em uma avaliação correta da natureza da época histórica e na formulação correta das tarefas políticas da classe trabalhadora.
Evidentemente, a questão da dimensão não deixa de ter importância. A derrubada do capitalismo não pode ser realizada através de uma conspiração por um pequeno grupo de pessoas. A revolução socialista exige a participação consciente de grandes massas. Porém, é um axioma do marxismo que a teoria só pode se tornar uma força material, num sentido historicamente progressivo e revolucionário, se o programa do partido identificar e articular a necessidade objetiva. Os partidos que se baseiam em uma falsa avaliação das condições objetivas, cujo programa não corresponde às exigências da época histórica, sofrerão eventualmente o naufrágio político quaisquer que sejam os seus sucessos temporários.
A persistência da Quarta Internacional
O que explica, então, a persistência histórica da Quarta Internacional? Acima de tudo, é a correspondência da análise e do programa da Quarta Internacional com o caráter objetivo da época. No documento de fundação da Quarta Internacional, a época histórica atual foi definida como aquela da agonia mortal do capitalismo. Trotsky escreveu:
O pré-requisito econômico para a revolução proletária já atingiu, em geral, o ponto mais alto que pode ser alcançado sob o capitalismo. As forças produtivas da humanidade estão estagnadas. As novas invenções e melhorias já não conseguem aumentar o nível de riqueza material. Crises conjunturais sob as condições da crise social de todo o sistema capitalista infligem privações e sofrimentos cada vez maiores sobre as massas. O desemprego crescente, por sua vez, aprofunda a crise financeira do Estado e mina os sistemas monetários instáveis. Os regimes democráticos, assim como os fascistas, vacilam de uma falência para outra.
Os avisos de Trotsky sobre uma catástrofe se tornaram realidade. A Segunda Guerra Mundial, que iniciou exatamente um ano após a fundação da Quarta Internacional, custou mais de 60 milhões de vidas. Com a indispensável assistência dos partidos stalinistas, a classe capitalista conseguiu sobreviver – através de uma combinação de compromissos políticos, concessões táticas e, quando absolutamente necessário, repressão implacável – às convulsões que varreram o mundo no desfecho da guerra. Durante várias décadas, reconstruindo sobre as ruínas da guerra, o capitalismo viveu um crescimento econômico substancial. Porém, as contradições fundamentais – entre a produção social e a propriedade privada das forças produtivas, entre o caráter integrado da economia mundial e o sistema de Estados nacionais – persistiram.
A dissolução dos regimes stalinistas no Leste Europeu e na União Soviética foi universalmente recebida pelas elites dominantes e pelos seus propagandistas midiáticos e defensores acadêmicos como o triunfo do capitalismo sobre o socialismo. O triunfalismo dos anos 1990 foi baseado em duas mentiras: que os regimes stalinistas eram socialistas, e que as contradições do capitalismo haviam sido de alguma forma ultrapassadas. Porém, à luz das experiências dos últimos 30 anos, é evidente que as comemorações do triunfo do capitalismo foram, no mínimo, prematuras. As elites dominantes haviam proclamado que, no desfecho da dissolução dos regimes stalinistas, o capitalismo daria paz, prosperidade e democracia universal à humanidade.
A realidade provou ser muito diferente. Começando com a invasão americana do Iraque em 1991 e a guerra civil na Iugoslávia, houve intermináveis conflitos militares. A “Guerra ao Terror” – desencadeada após os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 – está agora no seu décimo oitavo ano, sem fim à vista. Pelo contrário, a intensificação das rivalidades e conflitos geopolíticos está levando, inexoravelmente, ao início de uma Terceira Guerra Mundial. Os Estados Unidos deixaram claro que não irão permitir que a China o substitua como principal potência mundial, mesmo que seja necessário recorrer à força militar para contrariar a ascensão chinesa. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos estão em rota de colisão com a Rússia, que Washington vê como um obstáculo para os seus planos de dominar a Eurásia e o Oriente Médio. Ainda na semana passada, o embaixador dos EUA na OTAN declarou que os Estados Unidos estavam dispostos a realizar um ataque preventivo contra a Rússia para contrariar o que afirma ser o desenvolvimento ilegal de armas ofensivas. Uma ameaça tão explícita é uma perigosa escalada do conflito entre as duas maiores potências nucleares. O mundo está caminhando para a beira de uma guerra nuclear, com consequências letais.
Em um contexto de escalada da violência internacional, as tensões sociais estão aumentando em todos os países – especialmente nos países capitalistas avançados, incluindo os Estados Unidos. As causas subjacentes às tensões são a persistente crise econômica e os níveis assombrosos de desigualdade social. Menos de uma dezena de bilionários possuem mais riqueza do que metade da população mundial. Jeff Bezos, o proprietário da Amazon, possui uma fortuna pessoal estimada em US$ 150 bilhões. Em apenas uma hora, os milhões que se somam à sua fortuna são várias vezes a quantidade de dinheiro que um trabalhador médio receberá na sua vida inteira.
A desigualdade social e o colapso da democracia
A desigualdade social gera inevitavelmente conflitos sociais e de classe. A certa altura, a tensão social se torna tão extrema que os mecanismos da democracia começam a entrar em colapso. Essa é a situação que está agora surgindo em todo o mundo. A eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos é o sintoma de uma ruptura sistêmica das estruturas políticas democráticas estabelecidas há muito tempo através das quais a classe capitalista tem governado. Há amplas discussões sobre o perigo do retorno do fascismo ao poder.
Em Como as democracias morrem, os autores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt escrevem desolados:
A nossa democracia está em perigo? É uma pergunta que nunca pensamos que estaríamos fazendo... Nos últimos dois anos, temos visto políticos dizerem e fazerem coisas sem precedentes nos Estados Unidos – mas que reconhecemos como tendo sido os precursores da crise democrática em outros lugares. Estamos nos sentimos atemorizados, tal como muitos outros americanos, apesar de tentarmos nos assegurar de que as coisas não podem realmente ser assim tão ruins aqui.
No entanto, continuamos preocupados. ... Estamos vivendo o declínio e a queda de uma das democracias mais antigas e bem-sucedidas do mundo?
Madeleine Albright, a antiga secretária de Estado americana, escreveu um livro, intitulado Fascismo: Um Alerta, no qual ela fornece a seguinte explicação simplista para o ressurgimento da extrema-direita nos Estados Unidos:
Se pensarmos no fascismo como uma ferida do passado que havia quase sarado, colocar Trump na Casa Branca foi como arrancar o bandeide e cutucar a ferida.
Porém, esse diagnóstico político ignora o fato de que o ressurgimento do autoritarismo é um fenômeno mundial. Em O Povo contra a Democracia, Yascha Mounk chama a atenção para a escala global do ressurgimento dos movimentos fascistas:
É tentador, por exemplo, ver Donald Trump como um fenômeno exclusivamente americano. ... Porém, a verdadeira natureza da ameaça que Trump representa só pode ser compreendida num contexto muito mais amplo: o dos populistas de extrema-direita que têm ganhado força em todas as grandes democracias, de Atenas a Ancara, de Sydney a Estocolmo, e de Varsóvia a Wellington. Apesar das diferenças óbvias entre os populistas que estão crescendo em todos esses países, as suas semelhanças são profundas – e tornam cada um deles um perigo para o sistema político de formas surpreendentemente semelhantes.
Outro livro recentemente publicado, Como Funciona o Fascismo, de Jason Stanley, chama a atenção para o caráter global do crescimento do extremismo de direita:
Nos últimos anos, vários países em todo o mundo foram tomados por certos tipos de nacionalismo de extrema-direita; a lista inclui a Rússia, Polônia, Índia, Turquia e Estados Unidos... Escolhi o rótulo “fascismo” para o ultranacionalismo de alguma variedade (étnico, religioso, cultural), com a nação representada na pessoa de um líder autoritário que fala em seu nome.
A manifestação mais perigosa do ressurgimento fascista é dada pelos recentes acontecimentos na Alemanha, onde os nazistas – mais de 70 anos após o colapso do Terceiro Reich e o fim da Segunda Guerra Mundial – estão surgindo novamente como uma força política real. Manifestantes nazistas, entoando slogans racistas e antissemitas, marcharam pelas ruas de Chemnitz e Dortmund. O que torna essas manifestações particularmente significativas não é a sua dimensão. Os nazistas ainda são uma força política relativamente pequena, e são desprezados na Alemanha, mas eles dispõem de poderosos patrocinadores nos mais altos níveis do Estado alemão. Após a manifestação em Chemnitz, o ministro do Interior no atual governo de coalizão, Horst Seehofer, expressou a sua calorosa simpatia pela multidão nazista. O chefe do Gabinete Federal para a Proteção da Constituição, Hans Georg Maassen, negou – apesar das provas contrárias em vídeo – que a multidão havia ameaçado os transeuntes estrangeiros que assistiam à manifestação.
O que explica o renascimento do nazismo na Alemanha, o país que viveu todos os horrores do Terceiro Reich? Por todo o país, há inúmeros memoriais que homenageiam a memória das vítimas do hitlerismo. Porém, como uma doença que abrandou mas não foi curada, os velhos sintomas se manifestam mais uma vez. Trotsky, que produziu a melhor análise do fascismo, insistiu que esse flagelo político estava enraizado nas contradições do capitalismo, e que a ruptura da democracia burguesa – sob a pressão da crise econômica global, das tensões geopolíticas internacionais, e do conflito social interno – era um processo irreversível.
A democracia não pode ser resgatada e restaurada com base no capitalismo. Todos os avisos feitos por Trotsky na década de 1930, quando denunciou a política traiçoeira da Frente Popular – que subordinou a classe trabalhadora aos chamados partidos burgueses “liberais” e “progressistas” e, assim, assegurou a vitória do fascismo – adquirem imensa relevância contemporânea. Em 1936, Trotsky escreveu:
Ao desarmar os trabalhadores e camponeses com ilusões parlamentares, ao paralisar a sua vontade de lutar, a Frente Popular cria as condições favoráveis para a vitória do fascismo. A política de coalizão com a burguesia é paga pelo proletariado com anos de novos tormentos e sacrifícios, se não com décadas de terror fascista.
Todos os avisos de Trotsky foram confirmados. A “Frente Popular” terminou em desastres que custaram a vida de dezenas de milhões de pessoas entre 1939 e 1945. Entretanto, hoje em dia, os inimigos do trotskismo – ou seja, as figuras políticas pseudoesquerdistas fraudulentas, que desprezam as lições da história – invocam as mesmas políticas que foram responsáveis pelas catástrofes das décadas de 1930 e 1940. A professora Chantal Mouffe, que está entre as teóricas pseudoesquerdistas contemporâneas mais célebres, defende um “Populismo de Esquerda”, que nada mais é do que a última versão da colaboração de classe da frente popular neo-stalinista. Chamando abertamente pela rejeição da política de esquerda “essencialista”, baseada no papel revolucionário da classe trabalhadora e na centralidade da sua luta contra a exploração capitalista, Mouffe afirma que o Populismo de Esquerda “não requer uma ruptura ‘revolucionária’ com o regime democrático liberal”.
Ela escreve que “é possível provocar uma transformação da ordem hegemônica existente sem destruir as instituições liberal-democráticas”. O Estado capitalista-imperialista – o guardião brutal e massivamente armado da exploração, opressão e desigualdade – deve ser deixado intacto. Portanto, qual é a alternativa da professora Mouffe ao programa marxista para a derrubada revolucionária do Estado capitalista pela classe trabalhadora, a expropriação dos oligarcas capitalistas, e a abolição da propriedade privada dos meios de produção e do setor financeiro? Ela escreve: “Uma abordagem populista de esquerda deve tentar fornecer um vocabulário diferente” e uma “linguagem diferente” que possa fazer um apelo aos apoiadores dos partidos de direita! É possível imaginar uma expressão mais gritante de falência política? A professora Mouffe quer nos fazer acreditar que o perigo do fascismo pode ser combatido sem mobilizar a classe trabalhadora com base em um programa revolucionário. É necessário apenas decorar o reformismo com um novo vocabulário.
A crise da direção revolucionária
As alternativas políticas que se apresentam na época da agonia mortal do capitalismo são a barbárie fascista ou a revolução socialista. O triunfo de um ou de outro determinará o futuro da humanidade. A vitória do fascismo significa a morte da civilização humana. A vitória da revolução socialista abre a possibilidade de um renascimento e ascensão da civilização humana a um novo e glorioso nível. Essa é a escolha que temos.
Apontando os revéses das lutas revolucionárias das primeiras décadas do século XX, e procurando explicar a causa das muitas derrotas que se seguiram à grande vitória de outubro de 1917, Trotsky identificou a “crise da liderança revolucionária” como o problema básico da época. As condições objetivas existiam para a vitória do socialismo. Porém, o que restava era o problema não resolvido da liderança subjetiva. Essa continua a ser a tarefa fundamental da nossa época.
Os opositores do trotskismo – especialmente entre os representantes das inúmeras variedades da política pseudoesquerdista pequeno-burguesa – atacam habitualmente a Quarta Internacional, chamando-a de “sectária”. Eles não podem aceitar a recusa do Comitê Internacional de se ligar, como a pseudoesquerda pequeno-burguesa, à classe dominante.
Irritados pela nossa adesão a princípios, os nossos opositores apontam para o fato de o movimento trotskista não ter recrutado milhões para as suas fileiras. Uma frase popular entre os nossos inimigos é que “A Quarta Internacional foi proclamada por Trotsky, mas nunca construída”. Com essa frase, eles separam a evolução da Quarta Internacional de toda a história da luta de classes ao longo dos últimos 80 anos. Eles preferem esquecer que os partidos e organizações favorecidos pelos pseudoesquerdistas – os stalinistas, os maoístas, os nacionalistas burgueses, as burocracias operárias – procuraram bloquear o desenvolvimento da Quarta Internacional caluniando, aprisionando e assassinando os trotskistas.
O que os nossos opositores oferecem como alternativa à Quarta Internacional? Se eles tentassem comemorar os últimos 80, 40, ou mesmo 20 anos das suas atividades políticas, a quais conquistas políticas eles poderiam orgulhosamente apontar? Os stalinistas podem apontar para as ruínas da União Soviética e para a subsequente destruição econômica da Rússia. Os maoístas podem apontar para a transformação da China em um ponto focal do capitalismo global, o lar de dezenas de novos bilionários. Os castristas podem apontar como Cuba é novamente um paraíso para os turistas americanos, cujos dólares são essenciais para a sobrevivência da economia local. Os partidos social-democratas são praticamente indistinguíveis dos partidos tradicionais de direita da burguesia. O exemplo de Corbyn no Reino Unido apenas prova mais uma vez que as organizações social-democratas não podem ser transformadas em instrumentos da luta pelo socialismo. De fato, elas já nem sequer podem ser transformadas em instrumentos de pequenas reformas sociais. O que todas essas organizações têm em comum, para recordar a frase empregada por Trotsky, é que elas estão completamente podres.
A Quarta Internacional foi fundada por Trotsky para resolver a crise da liderança revolucionária na classe trabalhadora. Ele compreendeu que as tarefas políticas colocadas na época da agonia mortal do capitalismo não seriam facilmente cumpridas. Em maio de 1940, apenas três meses antes do seu assassinato por um agente do regime stalinista, Trotsky escreveu:
O mundo capitalista não tem saída, a não ser por uma longa agonia mortal. É necessário se preparar para longos anos, se não décadas, de guerra, revoltas, breves interrupções de trégua, novas guerras, e novas revoltas. Um jovem partido revolucionário deve se basear nessa perspectiva.
A humanidade passou, como Trotsky previu, por “décadas de guerra, revoltas, breves interrupções de trégua, novas guerras e novas revoltas”. Defendendo a herança do marxismo como uma minoria politicamente perseguida nas condições mais desfavoráveis, a Quarta Internacional, sob a liderança do Comitê Internacional, acumulou uma imensa experiência. Os acontecimentos justificaram a sua perspectiva histórica. Hoje, nesta fase tardia e muito avançada da agonia mortal do capitalismo, existem agora as condições para construir a Quarta Internacional como o massivo Partido Mundial da Revolução Socialista.