Com a variante Delta se espalhando em meio a maior reabertura de escolas e negócios desde o início da pandemia, o Brasil está apresentando uma clara tendência de desaceleração na diminuição de mortes por COVID-19. Há duas semanas, o país registrou o primeiro aumento de mortes em três meses. Desde então, o Brasil encontra-se em uma suposta “estabilidade” de mortes, com uma média de 479 mortes diárias nos últimos sete dias.
Na terça-feira, 5 de outubro, foram registrados 686 mortes e 22.109 casos, números que são enormemente subestimados. O Brasil está na posição 126 de testagem no mundo, com especialistas apontando que os números de casos e mortes podem ser, respectivamente, até dez e duas vezes maiores. Ao todo, são 598.871 mortes, atrás apenas dos EUA, e 21,5 milhões de casos.
Sete dos 26 estados brasileiros apresentaram um aumento de mortes por COVID-19 nas últimas duas semanas. Um dos maiores aumentos foi registrado no Distrito Federal, do qual faz parte a Capital Federal, Brasília, com um aumento de 18%. A ocupação de leitos de UTI vem também aumentado rapidamente no DF. De 31 de agosto a 28 de setembro, a taxa de ocupação de UTI aumentou de 52,5% para 75%. A taxa de leitos de UTI pediátricos é de 90%.
Depois de as escolas reabrirem no início de agosto, 14% dos casos registrados no DF no mês passado foram entre crianças, o maior índice desde o início da pandemia. De meados de agosto até o início de setembro, o número de escolas com casos confirmados aumentou de 14 para 61. Em 16 de setembro, segundo o sindicato de professores SINPRO, já eram 101 escolas com casos registrados.
Karla, uma mãe que possui o filho matriculado no ensino fundamental da rede pública distrital, contou ao WSWS que “a Secretaria de Educação do DF informou que tomaria todas as providências para que as escolas seguissem todos os protocolos exigidos. Entretanto, desde o início das aulas, aconteceram casos de infecção diários em diversas escolas. As turmas com casos foram dispensadas, mas os alunos dispensados não foram testados, nem os professores que entraram em contato com o infectado. Eles tinham que se virar para testar.”
Nas escolas públicas do DF, a volta às aulas aconteceu em sistema de rodízio, com metade dos alunos indo em uma semana, e metade indo em outra. Karla denunciou a falta de estrutura para o ensino remoto: “a maioria dos alunos da rede pública tem poucos ou nenhum meio para acompanhar as aulas na plataforma online ... Os governos deveriam ter dado tablets para cada criança e Wi-Fi para que pudessem estudar em casa.”
Além da falta de suporte tecnológico, ela disse que “Há alunos que tem apenas uma máscara, e o governo não ajudou nem com isso.”
Apesar do retorno à escola ser obrigatório, Karla contou que “Não estamos enviando os pequenos para as aulas presenciais. Ficamos sabendo da situação real de dentro das escolas em grupos nas redes sociais através de relatos de pais que estão enviando seus filhos para as escolas. Muitos estão morrendo de medo.”
Ela continuou: “Algumas escolas fizeram ameaças para as famílias que não estavam enviando os filhos às aulas presenciais, negando as aulas online nas semanas que deveriam ser presenciais. Em outras, a escola obrigou as famílias a preencherem um termo de responsabilidade como desculpa e se eximindo da responsabilidade do aluno em não comparecer às aulas. Só os alunos com comorbidades não são obrigados a ir para a escola, mas devem obrigatoriamente apresentar laudo médico.”
Karla, que é pedagoga, também denunciou o SINPRO. “Nunca gostei do sindicato dos professores ... são muitas promessas e nenhuma ação em prol da categoria.” Com a reabertura de escolas, segundo ela, “Houve uma promessa de que o sindicato ficaria intensivamente na fiscalização das escolas, mas nem os dados transparentes eles informam.”
Karla ressaltou o papel do sindicato em isolar os professores nas escolas, o que também tem sido feito por sindicatos em todos os lugares do mundo e de todas as categorias da classe trabalhadora. “Uma coisa que observo é que as escolas não conversam entre si”, disse. “Eu repasso as informações de outras escolas para amigos professores que nem faziam ideia de que estava acontecendo.”
Isso fez com que se unisse “a um grupo de pais contra as aulas presenciais no DF quando vi uma matéria no jornal local que havia um movimento contra a abertura das escolas e que estavam se unindo a fim de buscarem medidas legais”. Karla, no entanto, explicou que é “contra a reabertura das escolas, bem como a obrigatoriedade das aulas presenciais ... Mas não porque estamos negando o direito à educação, mas, de acordo com a Constituição, estamos lutando a favor da vida, protegendo nossas crianças e jovens.”
Em 14 de setembro, foi confirmada a primeira morte por COVID-19 de um professor no DF. Joselini Gomes, de 53 anos, era professor do Centro Educacional Stella dos Cherubins, na região administrativa de Planaltina.
Em uma forte denúncia da situação das escolas no DF que viralizou nas redes sociais, Luiza Oliveira, colega de Joseli, escreveu que “Estamos atravessando uma realidade inimaginável em nossa escola. Quando fomos retornar às aulas presenciais, alertei muitas vezes nossa equipe que não tínhamos condição de ter um retorno seguro. Para isso, seria necessário a ventilação adequada das salas de aula, máscaras seguras (PFF2) disponibilizadas para todos e um protocolo eficiente de isolamento e testagem. Não temos nenhuma dessas condições em nosso colégio.”
“Desde o início do retorno presencial”, ela continuou, “começaram a aparecer os casos suspeitos e confirmados entre colegas e estudantes ... Porém, o monitoramento da Secretaria de Saúde e de Educação desses casos é ineficaz e não sabemos onde estão os casos suspeitos. Até o início desta semana [13 de setembro], mesmo com o surgimento desses casos suspeitos e confirmados, a aula de nenhuma turma havia sido suspensa.”
Sem testagem nas escolas e em hospitais públicos, Oliveira escreveu que “a grande maioria está testando na rede privada, tirando o dinheiro do próprio bolso”.
“É triste demais e muito revoltante ver que precisou um professor da escola morrer para que alguma coisa acontecesse”, ela declarou. “Medidas que já deveriam ser tomadas há muito tempo, como suspensão de aulas e sanitização da escola, só foram tomadas agora. Ontem, a Secretária de Educação, Hélvia Paranaguá, ligou à nossa escola para expressar seus sentimentos à comunidade escolar. O que esperamos da Secretária de Educação e do Governo do DF é que deixem de ser irresponsáveis e desumanos com estudantes, servidores e seus familiares. O que está ocorrendo é um absurdo. Nossos colegas que ainda não completaram o ciclo de imunização e estão esperando a segunda dose foram obrigados a retornar ao trabalho em meio a esse surto de COVID.”
Oliveira concluiu seu relato dizendo: “Não dá mais pra ver essa política genocida do governo do DF [de Ibaneis Rocha] acontecendo, nossos colegas adoecendo e morrendo e não se fazer nada.”
Sobre o governador, Karla também disse ao WSWS que, “no início, achei que ele era um ser consciente. Mas, além de político, é empresário. Ele quer movimentar o dinheiro e a economia, finge que se preocupa, mas sabemos que não.”
Longe de serem casos isolados, as situações relatadas por Karla e Luiza Oliveira são encontradas em todas as escolas do mundo em meio a uma pandemia global. Crianças, professores e funcionários estão sendo empurrados a escolas inseguras para assegurar os lucros da elite dominante mundial.
No entanto, a classe trabalhadora internacional está respondendo a essa política de morte. De maneira significativa, na semana passada, Lisa Diaz fez um chamado para que pais no Reino Unido mantivessem seus filhos em casa como parte de uma greve de um dia contra a reabertura assassina de escolas. O chamado de greve teve apoio em todo o mundo.
No Brasil e em muitos outros países, comitês de base têm sido formados para avançar um programa de erradicação do novo coronavírus através da mobilização independente da classe trabalhadora. Nós fazemos um chamado para que todos aqueles que estão procurando uma maneira de lutar contra a reabertura de escolas entrem em contato conosco e sigam a página do Facebook do Comitê de Base pela Educação Segura no Brasil.