Publicado originalmente em 8 de outubro de 2021
Na semana passada, em depoimento durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado sobre as políticas do governo em resposta à pandemia de COVID-19, a advogada dos médicos empregados pela empresa de saúde, Prevent Senior, expôs um regime de coerção, intimidação e encobrimento em torno da prescrição dos chamados “kits COVID”, que resultou na morte de centenas de pacientes idosos.
Em agosto, uma denúncia assinada por 15 médicos da Prevent Senior tornou público que a empresa, uma seguradora e provedora de saúde para mais de 600 mil idosos, vinha funcionando como um centro de operações para o presidente fascistoide Jair Bolsonaro em sua campanha pela “imunidade de rebanho” através de infecções em massa.
Em abril de 2020, um “pacto” foi criado entre a Prevent Senior e a administração Bolsonaro para promover a hidroxicloroquina e a ivermectina, ambas amplamente promovidas pelo presidente como “tratamentos precoces” contra a COVID-19 que facilitariam a reabertura da economia. Os protocolos médicos da COVID-19 da Prevent Senior foram criados com o auxílio de associados médicos próximos do presidente.
Os médicos revelaram que diretores da empresa ordenaram a prescrição dos medicamentos cientificamente desacreditados, chamados de “kits COVID”, para pacientes idosos sintomáticos e hospitalizados sem que eles ou seus familiares soubessem. A advogada dos médicos, Bruna Morato, disse que isso resultou na morte de centenas de pacientes. Enquanto isso, um número desconhecido de pacientes com COVID-19 teve a causa da morte alterada após 10-14 dias de internação. O objetivo da companhia era declarar falsamente ter uma maior taxa de recuperação de pacientes com COVID-19 por tomarem esses medicamentos.
A equipe médica nos hospitais também foi ordenada a prescrever os medicamentos ineficazes para si próprios no caso de desenvolverem sintomas de COVID-19. Durante uma entrevista com os denunciantes no sábado, os médicos contaram uma rotina em que prescreviam os “kits COVID”, e tinham que dizer em segredo aos seus pacientes para que não tomassem os medicamentos. “Eles observavam quem estava prescrevendo as receitas e quem não estava. Era uma situação em que eles tinham controle, portanto não havia autonomia”, disse um médico.
O dono da Prevent Senior, Eduardo Parrillo, impôs sistematicamente o seu regime de terror com a seleção de “guardiões” leais à empresa, escolhidos para supervisionar os médicos plantonistas e garantir que eles estavam seguindo as ordens da empresa.
O Dr. Walter Correa de Souza, ex-médico da empresa, declarou: “Como alguém que trabalhou como bombeiro militar por muitos anos, nunca vi uma hierarquia tão rigorosamente aplicada como a que existe dentro da empresa. Nem mesmo no Exército”.
As táticas de intimidação incluíam ameaças de demissão por coordenadores hospitalares contra os médicos que se recusassem a prescrever os falsos tratamentos. A advogada, Morato, disse que a empresa demitia freqüentemente funcionários que discordavam das suas medidas.
Os protocolos da Prevent Senior eram aplicados enquanto Bolsonaro pressionava o Ministério da Saúde a incluir oficialmente a cloroquina como um medicamento para COVID-19.
Em maio de 2020, Bolsonaro nomeou como ministro da Saúde o general do Exército, Eduardo Pazuello, que levou adiante a campanha de imunidade de rebanho do presidente, promovendo a cloroquina. Mais tarde, em janeiro de 2021, ele transformou Manaus em uma armadilha mortal, recusando-se a enviar suprimentos de oxigênio para a capital do Amazonas, apesar de vários alertas.
A sessão da CPI com o advogado Morato também revelou que um diretor do hospital recomendou e supervisionou o interrupção do fornecimento de oxigênio aos pacientes internados por mais de 10-14 dias, afirmando que “morte também é alta [hospitalar]”.
Em março-abril de 2020, os diretores da Prevent Senior coordenaram uma experiência secreta em pacientes idosos, tratando-os como “cobaias humanas”. Depois de serem secretamente medicados com hidroxicloroquina e azitromicina, os resultados desses pacientes foram “arredondados de acordo com o discurso de Bolsonaro”, conforme ordenado pelo Dr. Rodrigo Esper, que coordenou o macabro experimento.
Esper e seus chefes publicaram o “estudo” em uma versão “pre-print” após distorcer os dados para publicar falsamente que ninguém morreu como resultado da ingestão dos medicamentos. Na realidade, nove pacientes que haviam tomado os medicamentos morreram, o dobro do grupo que havia recebido um placebo.
Morato relacionou as ações bárbaras da empresa e a campanha apoiada pela elite dominante pela reabertura da economia, apesar do aumento esperado em casos e mortes. Referindo-se aos assessores médicos mais próximos de Bolsonaro, “completamente alinhados com os interesses econômicos do Ministério da Economia”, Morato afirmou que “eles se referiam a um ‘alinhamento ideológico’ no qual a economia não poderia parar e, assim, o que eles tinham que fazer era dar esperança às pessoas. Essa esperança tinha um nome: hidroxicloroquina”.
Essas experiências macabras não poderiam ter sido realizadas sem o apoio dos donos da empresa, os irmãos Parrillo, que implementaram um sistema de intimidação em toda a empresa para conduzir as experiências com os idosos durante a pandemia.
Os médicos da Prevent Senior e Morato também revelaram que os “guardiões” frequentemente cantavam um hino com as mãos no peito durante os eventos da empresa. Os irmãos Parrillo tocavam suas guitarras enquanto os guardiões eram ordenados a cantar.
A letra inclui as seguintes passagens: “Nascemos para viver de lutas até morrer, ... E, juntos, nós venceremos, Com espadas e com canhões, Nós somos os guardiões”. O ritual é inspirado nas forças paramilitares nazistas, Waffen SS, selecionadas por seu “sangue puro” para proteger Hitler.
Morato declarou que o lema inspirado na SS, “obediência e lealdade”, foi instituído em 2015, e é promovido até hoje por diretores da empresa.
Os irmãos Parrillo são membros da banda de rock, Doctor Pheabes, tendo dado shows de abertura para bandas de rock famosas, tais como Black Sabbath e The Rolling Stones durante festivais de música como Lollapaloza e Rock in Rio. A banda lançou seu último álbum em 2019, chamado “Army of the Sun” (Exército do Sol), uma referência direta às Waffen SS.
Tais figuras sentiram a liberdade para realizar esses atos abomináveis em condições nas quais governos inteiros estão cada vez mais abertamente defendendo que as mortes de milhões sejam tratadas como o novo “normal”, ao qual as pessoas terão que se acostumar durante a pandemia.
Se Bolsonaro e o primeiro-ministro Boris Johnson no Reino Unido estão realizando seus experimentos em larga escala com milhões de pessoas para alcançar a imunidade de rebanho, pareceria natural para esses elementos fazer o mesmo.
Desde abril de 2020, quando esses bárbaros atos foram coordenados diretamente por simpatizantes nazistas na administração da empresa, os governos no mundo inteiro têm defendido cada vez mais abertamente a reabertura das escolas e da economia, resultando na morte de milhões de pessoas em todo o mundo.
Na terça-feira, os prefeitos das duas maiores cidades do Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro, anunciaram o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras nas próximas semanas, com a justificativa de que os índices de vacinação teriam que ser altos. As medidas criminosas dos prefeitos foram declaradas enquanto a variante Delta está se espalha pelos EUA e Reino Unido, mostrando que, mesmo com a maior parte da população tendo tomado duas doses da vacina, milhares de pessoas continuarão a morrer a cada semana.
Seguindo os passos de Bolsonaro, desde abril do ano passado, os governadores têm apoiado cada vez mais abertamente a campanha do governo de imunidade de rebanho através da infecção em massa. O lema “a cura não pode ser pior que a doença” foi completamente adotado pelo Partido dos Trabalhadores (PT), em que o governador Camilo Santana do Ceará foi um dos primeiros a reabrir a economia do seu estado após a primeira onda, acompanhado por seus colegas governadores do PT na Bahia e no Rio Grande do Norte.
Essa é a razão pela qual, após as práticas da Prevent Senior terem sido expostas, os esforços para conter e encobrir o episódio foram intensificados. O procurador geral do Ministério Público de São Paulo declarou que “devemos responder rapidamente, mas com justiça, para dar uma resposta rápida à população, mas também para não prejudicar a empresa”. Ele concluiu dizendo que “temos que ser cirúrgicos”.
As investigações da CPI no Brasil são um esforço para afastar a culpa pelas 600 mil mortes do país de todo o establishment político, que levou adiante medidas de mitigação totalmente inadequadas enquanto forçou as crianças a retornarem às escolas e os trabalhadores às fábricas para garantir lucros para os ricos.
Enquanto isso, ao invés de emitir um pedido de desculpas, a empresa está dobrando a sua ofensiva contra os denunciantes médicos, mostrando o quanto os chefes da empresa estão confiantes de saírem impunes. A Prevent Senior está culpando os próprios médicos por prescreverem as receitas, tentando inverter a realidade, e declarou em setembro que os denunciantes eram os criminosos por acessarem registros dos pacientes.
O fato de que tais indivíduos receberam poder e cargos em conselhos médicos é a expressão de uma ordem social decaída, que coloca o lucro acima de tudo, incluindo a vida das pessoas. O fato de que eles são capazes de manter cargos políticos é sinal de que a classe dominante está se preparando para enfrentar as massivas lutas da classe trabalhadora com métodos de repressão abertamente antidemocráticos e violentos.
A resposta a esses preparativos da classe dominante é a organização dos trabalhadores na Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB) para preparar uma contraofensiva da classe trabalhadora para levar adiante um programa de erradicação da pandemia. Tal ofensiva deve ser feita como parte da luta para pôr fim ao sistema capitalista, que coloca os lucros acima da vida humana, e construir uma sociedade baseada na necessidade humana, ou seja, a luta pelo socialismo.
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