Publicado originalmente em 15 de outubro de 2023
Conforme a greve dos trabalhadores automotivos nos EUA confronta diretamente as grandes corporações transnacionais automotivas e o governo Biden nos EUA, o UAW continua mantendo a greve limitada a algumas plantas, e preparando um acordo de concessões contra a vontade da maioria de trabalhadores que querem uma guerra em escala total na indústria automotiva.
Longe de se limitarem aos EUA, os sindicatos de todo o mundo têm suprimido as lutas da classe trabalhadora, colaborando com as empresas e o Estado capitalista no aumento do desemprego e na redução dos padrões de vida dos trabalhadores. Como resultado, as lutas dos trabalhadores nos últimos anos se transformaram em uma rebelião contra os sindicatos corporativistas.
No Brasil, a globalização capitalista levou ao fechamento de fábricas em massa a partir da década de 1990, que foi supervisionado tanto pelo “novo sindicalismo” associado à CUT, a federação sindical controlada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), quanto pelas antigas lideranças trabalhistas e stalinistas que, em 1991, criaram a Força Sindical para defender as políticas neoliberais de ataques contra os trabalhadores e “modernizar” as relações trabalhistas.
Esse processo uniu sindicatos americanos e brasileiros, que começaram a temer que o processo de desindustrialização que Detroit atravessou pudesse se repetir, principalmente na região industrial do ABC, em São Paulo, berço político do PT e da CUT.
Essa relação levou os líderes da CUT, da Força Sindical e de outros sindicatos brasileiros a emitirem uma declaração conjunta em 18 de setembro em “solidariedade à trabalhadores em greve nos EUA”. Um dia depois, Luiz Marinho, ministro do Trabalho do governo do PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva – ambos ex-presidentes do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC) – reuniu-se com dirigentes de seção regional do UAW em um “gesto de solidariedade, em nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.
Marinho e os líderes sindicais brasileiros foram aos EUA para acompanhar Lula na Assembleia Geral da ONU e no lançamento da fraudulenta “Parceria para os Direitos dos Trabalhadores” com o governo Biden e autoridades sindicais americanas. Ao contrário das alegações oficiais de que tal iniciativa é um “compromisso mútuo com os direitos dos trabalhadores e a promoção do emprego decente”, ela representa um novo estágio na integração dos sindicatos ao Estado capitalista, ao mesmo tempo em que serve para encobrir o longo histórico de ataques contra os trabalhadores dos governos Lula e Biden.
Os trabalhadores americanos do setor automobilístico devem tratar tanto a “Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores” quanto a “solidariedade” dos sindicatos brasileiros e do ministro do trabalho de Lula com desconfiança.
Sob a presidência de Marinho no SMABC, no final da década de 1990, o sindicato começou a promover abertamente a concepção de um interesse comum entre trabalhadores e empresas no combate ao neoliberalismo, forçando contratos de concessões para tornar as fábricas mais “competitivas” e assegurar uma suposta garantia de emprego.
Os resultados dessa política têm sido desastrosos para os trabalhadores, principalmente na região do ABC. Símbolos da industrialização brasileira do pós-guerra, a Ford e a Toyota fecharam suas fábricas na região do ABC nos últimos dois anos. De 1989 a 2017, a região do ABC perdeu quase metade da sua força de trabalho industrial, passando de 363 mil para 182 mil.
Assim como nos EUA, as empresas automotivas estão entrando na ofensiva contra os trabalhadores no Brasil, dessa vez utilizando a transição para veículos elétricos para afirmar a necessidade de uma “reestruturação”. A virada da indústria automotiva aos veículos elétricos promete uma enorme destruição de empregos.
No mês passado, em uma entrevista à revista Autodata, o presidente da Mercedes-Benz (Daimler) no Brasil, Achim Puchert, afirmou: “Nossa intenção é terceirizar tudo localmente, na mesma região, com fornecedores locais de componentes que terão desempenho melhor”. No ano passado, a empresa anunciou um plano de cortes incluindo 3,6 mil demissões, que começaram imediatamente em setembro do ano passado e foram a causa imediata para a greve na fábrica de São Bernardo do Campo.
No fim de junho deste ano, a empresa já anunciou a terceirização de 500 empregos na reposição de peças e remanufatura na planta em Campinas no estado de São Paulo. A única demanda que o sindicato regional foi capaz de lançar foi “urgência para que os governos municipal, estadual e federal atuem nisso”. Isso significa colocar qualquer esforço para defender os empregos nas mãos do governo ao mesmo tempo em que dá tempo para a empresa realizar seus cortes.
A GM também está anunciando uma nova rodada de cortes nas suas três fábricas em São Paulo e Gravataí no Rio Grande do Sul. Assim como no caso da Mercedes, os cortes massivos estão sendo justificados pelas condições econômicas no Brasil. Em um documento enviado aos trabalhadores, a empresa afirma: “o cenário de vendas de veículos no Brasil está obrigando a indústria automotiva a fazer ajustes em suas capacidades produtivas. Agora, os ajustes não são mais por falta de peças: é necessário adaptar as fábricas ao tamanho do mercado”.
Em um relance do enorme assalto que a implementação dos planos da GM irá significar, uma trabalhadora que entrou em contato com o WSWS afirmou: “Na GM de São Caetano nao está tendo extensão [da jornada de trabalho], pelo contrário o pessoal disse que está acontecendo ameaça de duzentas a quinhentas demissoes! O sindicato fez assembléia sobre o PDV e a galera votou contra e mesmo assim a empresa fez o PDV, mas pouca gente aderiu”.
Na planta de Gravataí, a única que não teve notícia sequer de uma proposta de PDV, a trabalhadora informou o WSWS de que “estão ameaçando lay-off ou demissões, mas o que tem acontecido na pratica são extensões de jornada que deixam todo mundo quebrado. Nao sabemos se já é algum reflexo da greve lá ou não”. Ela acrescentou que esse regime entrou em vigor com o início da pandemia.
As demonstrações financeiras da Mercedes-Benz exibiram lucros acima do esperado nos últimos quatro trimestres, com a última demonstração em julho registrando um lucro de US$3,34 bilhões. É esperado um lucro adicional de US$3,13 bilhões no final deste mês. Lucros em escalas similares foram obtidos pela GM no último ano, tendo declarado US$2,51 bilhões até o fim de junho.
Ou seja, diferente das afirmações da administração corporativa, os lucros da empresa e generosas compensações dos seus acionistas estão mais do que garantidos, enquanto centenas de trabalhadores serão colocadas no desemprego e em jornadas de trabalho extenuantes.
Enquanto o sindicato do UAW suprime e isola a luta dos trabalhadores americanos, não há dúvida de que os sindicatos automotivos brasileiros estão se preparando para cumprir esse mesmo papel no Brasil em nome dos interesses das grandes corporações automotivas.
Entretanto, assim como nos EUA, após anos trabalhando como agentes das empresas na imposição de cortes de salários e empregos, as burocracias sindicais estão completamente desacreditadas aos olhos dos trabalhadores, em um período de enorme intensificação da luta de classes internacional. Em todos os lugares, os trabalhadores enfrentam cada vez mais o empobrecimento, aumento do custo de vida em meio à inflação, e o desmonte dos resquícios de programas sociais pelos governos.
É necessário que a enorme oposição dos trabalhadores a uma nova rodada de concessões às grandes empresas assuma forma organizada e independente em comitês de base para romper o isolamento e promover uma greve em toda a indústria automotiva. Os trabalhadores serão enormemente fortalecidos por uma luta unificada através das fronteiras nacionais.
Em uma declaração conjunta, o comitês de base dos ferroviários nos EUA e o comitê de base dos metalúrgicos automotivos em Hamilton, Ontário no Canadá afirmaram:
“Para realizar uma luta efetiva, os trabalhadores automotivos devem construir comitês de base em todas as fábricas, afiliarem-se à Aliança Operária Internacional de Comitês de Base, esmagar as burocracias sindicais e restaurar o poder aos trabalhadores no chão de fábrica. Assim como o sistema de produção capitalista opera em escala mundial, o movimento dos trabalhadores também deve. Os trabalhadores devem trazer a luta para a arena mundial e conectar os comitês de base em todo setor industrial e em todos os países do mundo”.