Uma luta intransigente dos cerca de cinco mil trabalhadores da Renault no Complexo Industrial Ayrton Senna (CAS), em São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba, no estado do Paraná, está desafiando as tentativas do sindicato de encerrar o movimento com uma derrota.
Os trabalhadores aprovaram uma nova paralisação de 24 horas no último dia 11, apenas uma semana depois de o Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba (SMC) encerrar uma greve que durava 29 dias.
Na ocasião, o presidente do SMC, Sérgio Butka, declarou que a suspensão da greve era “um voto de confiança dos trabalhadores na empresa”, que “se comprometeu a apresentar uma nova proposta em 72 horas”.
A principal demanda dos trabalhadores é a contratação de 300 operários, para suprir o ritmo intenso na linha de produção. Ao longo da greve, a empresa havia oferecido 50 contratações e, agora, após a suspensão da greve, ofereceu 70, mas foi novamente recusada por uma assembleia massiva e uma nova paralisação na fábrica.
A insatisfação e revolta com as condições na empresa já haviam sido claramente demonstradas pelos trabalhadores durante a greve. Por três vezes consecutivas, eles rejeitaram a proposta da empresa. Além das contratações, o movimento também exige R$ 30 mil de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) e 6,8% de reajuste salarial, contra os R$ 25 mil de PLR e pouco mais de 4% de reajuste salarial oferecidos pela Renault.
A sobrecarga na linha de produção tem provocado o adoecimento sistemático dos trabalhadores. Segundo dados do sindicato divulgados pelo portal da Assembleia Legislativa do Paraná, mil trabalhadores estão afastados da fábrica atualmente devido a lesões por esforço repetitivo.
Ainda segundo o próprio SMC, uma evidência da atual intensidade do trabalho “é o índice de engajamento do trabalhador na linha de produção que está em 95%, ou seja, dentro do processo de trabalho, o trabalhador tem apenas 5% de tempo para dar ‘uma respirada’”.
O Bem Paraná relatou que os operários não conseguem sair da linha de produção nem para suas necessidades fisiológicas. Segundo o jornal, “Devido à falta dos absenteístas, há relatos de trabalhadores que tiveram de esperar até 40 minutos para utilizar o banheiro”.
Com uma produção diária de cerca de 800 veículos, a unidade deixou de produzir 15.545 veículos durante a greve. O movimento também atingiu a fábrica de motores Horse, que fica no mesmo complexo da Renault e tem cerca de 600 trabalhadores que produzem 900 motores por dia.
Para pressionar os trabalhadores a voltarem ao trabalho, a Renault/Horse havia cortado o pagamento dos salários, e contou com o apoio da Justiça burguesa, que julgou a greve como ilegal.
Já na primeira decisão do Tribunal Regional do Trabalho, no dia 9 de maio, o desembargador Marco Antonio Vianna Mansur determinou o retorno imediato ao trabalho, afirmando que havia “clara aparência de paralisação abusiva do trabalho” e determinando aplicação de uma multa diária de R$ 30 mil ao sindicato em caso de descumprimento da decisão. Com a permanência do movimento grevista, no dia 17 de maio o TRT aumentou o valor dessa multa para R$ 100 mil.
A suspensão dessa multa foi a grande “vitória” do sindicato. Ao encerrar a greve de 29 dias, o SMC alegou que a empresa “aceitou a proposta de suspender a liminar judicial contra o movimento grevista”.
Atualmente, a planta da Renault em São José dos Pinhais possui cerca de 5 mil trabalhadores, sendo 3.500 da produção e 1.500 administrativos. São 2 mil trabalhadores a menos do que em 2020, quando uma greve parou a fábrica com uma forte adesão.
Na época, os trabalhadores se mobilizaram contra uma demissão em massa feita pela empresa. Já naquele momento os operários relataram ao WSWS que estavam adoecendo por causa da intensidade na linha produtiva. E denunciaram que a empresa tentava aproveitar a pandemia para “descartar” os funcionários com doenças ou lesões adquiridas no trabalho.
A greve resistiu por 20 dias e enfrentou inclusive a repressão policial. O movimento foi encerrado pelo sindicato em um acordo que prometia reintegrar parte dos 747 demitidos com a condição de que, no lugar deles, saíssem outros voluntariamente, por meio de um Plano de Demissão Voluntária.
A condição atual, de uma força de trabalho reduzida e superexplorada, é o produto de uma série de derrotas conduzidas pelo sindicato, cujo presidente, Sergio Butka, tem se revelado nos últimos anos como uma peça importante para os interesses capitalistas na região.
O papel cumprido por Butka e o SMC ficou claro numa declaração do presidente da Renault do Brasil, em dezembro do ano passado, quando a empresa anunciou R$ 2 bilhões em investimentos na fábrica para a produção de um C-SUV “completamente novo”, com motor híbrido.
Segundo a notícia divulgada pelo site da empresa, “Para este ciclo de investimento, foram muito importantes as condições concedidas pelo Estado do Paraná e pelo atual acordo coletivo com o Sindicato dos Metalúrgicos da Região Metropolitana de Curitiba (SMC), representando os colaboradores da Renault do Brasil”.
Além de presidente do SMC, Butka é o presidente da Federação dos Metalúrgicos do Paraná (Fetim) e da Força Sindical do Paraná. A Força Sindical é a segunda maior central sindical do país e, apesar de ter cerca de 1.700 sindicatos filiados, seu trabalho é justamente manter divididos os trabalhadores em cada um desses sindicatos, bloqueando a unificação das suas lutas nacional e internacionalmente.
A Renault é uma empresa de origem francesa com instalações espalhadas pelo mundo inteiro e está inserida numa corrida internacional pelo lucro em meio a uma reestruturação na indústria automotiva com foco em veículos elétricos e híbridos. Essa reestruturação tem sido levada a cabo com um massacre da força de trabalho internacionalmente.
É nesse contexto que a luta dos trabalhadores da Renault do Brasil deve ser vista. O movimento por mais empregos na Renault não pode ser levado adiante por Butka e o SMC. Esse movimento exige a independência política dos trabalhadores em relação às burocracias sindicais e ao Estado capitalista, e uma orientação internacional, que se dirija aos trabalhadores de outras fábricas não só no Brasil mas ao redor do mundo.