Publicado originalmente em 25 de setembro de 2023
A crescente rebelião entre os trabalhadores da indústria automotiva dos EUA contra os esforços da burocracia do Sindicatos dos Trabalhadores da Indústria Automotiva (UAW) para trair a sua batalha contratual contra as Três Grandes está tendo um efeito radicalizador entre os trabalhadores a nível internacional. No México, os trabalhadores das fábricas montadoras e de autopeças juntaram-se aos seus irmãos e irmãs de classe ao norte da fronteira e fizeram numerosas exigências para expandir a luta por toda a América do Norte contra a sabotagem do UAW nos EUA e do Unifor no Canadá.
Embora as questões dos aumentos salariais e outras exigências feitas em relação aos contratos automotivos sejam extremamente importantes, o que está emergindo nas discussões diretas entre os trabalhadores é a vontade de unir forças para lutar pelos seus interesses de classe em comum. A desigualdade, a transição para veículos elétricos, a guerra e outras questões sociais mais amplas estão cada vez mais em evidência.
A questão que se coloca na mente de muitos trabalhadores é como podem ser estabelecidas verdadeiras “organizações operárias independentes” para tirar o poder da burocracia sindical e fazer valer a sua vontade. Este é, em última análise, um desafio político e revolucionário que implica a questão de qual classe social controla a riqueza da sociedade: uma pequena oligarquia capitalista ou a classe trabalhadora.
Alarmadas com estas discussões e com o crescente movimento dos comitês de base sob a influência do World Socialist Web Site e do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI), as organizações pseudoesquerdistas da classe média estão trabalhando para reforçar o controle da burocracia sindical e do Partido Democrata sobre os trabalhadores.
A pseudoesquerda intervém para subordinar trabalhadores à AFL-CIO e Biden
Essas forças também estão intervindo agressivamente entre os trabalhadores do setor automotivo no México, que demonstraram sua solidariedade aos trabalhadores dos EUA e do Canadá repetidamente nos últimos anos. As intervenções de La Izquierda Diario (que publica o Esquerda Diário no Brasil) têm buscado sistematicamente subordinar os trabalhadores aos parceiros mexicanos da confederação sindical AFL-CIO, à qual o UAW pertence.
Durante a greve nacional da General Motors nos EUA em 2019, os trabalhadores da fábrica de montagem da GM em Silao, que haviam formado um grupo militante de base para se opor à corrupta Confederação de Trabalhadores do México (CTM), entraram em contato com os grevistas americanos e se recusaram a trabalhar horas extras obrigatórias, o que levou a demissões e formação de listas negras de trabalhadores combativos.
O Left Voice/LID publicou recentemente um artigo de um desses trabalhadores descrevendo como o Solidarity Center da AFL-CIO, que recebe cerca de 94% de seu orçamento do Departamento de Estado dos EUA, interveio com financiamento e um grupo de advogados para acabar com o grupo de base e impor um sindicato dito “independente”, o SINTTIA, composto por trabalhadores “escolhidos a dedo pelos assessores do comitê”.
O Left Voice/LID reconheceu que o SINTTIA “é apoiado por organizações sindicais nacionais e internacionais, tais como: FESIAAAN, Unifor ou AFL-CIO, as duas últimas representando os interesses do imperialismo de seus respectivos países (Estados Unidos e Canadá)”. Além disso, eles escrevem que, ao patrocinar sindicatos mexicanos, a AFL-CIO busca “garantir a paz trabalhista nas filiais das transnacionais no país... para defender o capital imperialista”.
Tendo admitido que o SINTTIA é um suporte do imperialismo americano e canadense, os morenistas ainda o chamam de “sindicato independente” e dizem aos trabalhadores para apoiá-lo e seus laços com os burocratas imperialistas. Por exemplo, durante a votação na fábrica da GM em Silao, eles escreveram, “acompanhamos os trabalhadores que querem expressar sua oposição à CTM e pedimos que votem criticamente no SINTTIA”.
Em seguida, o Left Voice/LID relatou no Primeiro de Maio do ano passado que o SINTTIA carregava faixas da AFL-CIO e do Unifor. Logo a publicação comentou: “As declarações de solidariedade da AFL-CIO e do Unifor precisam ser traduzidas em ações reais” de apoio ao SINTTIA.
De modo mais geral, o Left Voice/LID insiste em apoiar “todas as organizações sindicais que se dizem independentes” e em formar novas organizações. Enquanto isso, em um artigo da Labor Notes no ano passado, Jeffery Hermanson, funcionário de longa data do Solidarity Center e da AFL-CIO, listou todos os novos sindicatos “independentes” que o Solidarity Center e o Unifor lançaram, incluindo o SINTTIA, a sua associada Casa Obrera para criar sindicatos semelhantes, o SNITIS em Matamoros e vários outros apoiados pelo LID. Hermanson, então, pediu “uma abordagem industrial e nacional com foco nos principais empregadores e setores em agrupamentos industriais regionais ao longo da fronteira norte ou nas cadeias de suprimentos automotivos de Guanajuato [onde Silao está localizado], Morelos e Puebla”.
A instalação de novos sindicatos pró-capitalistas como armadilhas para subjugar os trabalhadores mexicanos e impedir a unificação real dos trabalhadores de base em toda a América do Norte é um elo fundamental nos planos de guerra do imperialismo americano e canadense. Considerando o fato de que esses novos sindicatos estão sendo desacreditados como ferramentas de gestão, os morenistas estão desempenhando um papel crucial para ajudá-los a manter o controle sobre os trabalhadores.
Falando concretamente, opor-se aos apologistas políticos e agentes diretos do imperialismo é um dos primeiros passos rumo à independência de classe.
O que significa a verdadeira independência para a classe trabalhadora?
O último artigo escrito pelo revolucionário russo Leon Trotsky, antes de ser morto por um agente stalinista em Coyoacán, na Cidade do México, em 1940, foi justamente sobre essa questão (“Os sindicatos na época da decadência imperialista”, que permaneceu inacabado). A principal característica dos sindicatos no atual estágio do capitalismo, escreveu ele, era sua integração ao Estado capitalista. Como exemplo, ele usou a CTM no México, que já havia adquirido um caráter “semitotalitário” ao ser totalmente incorporada – mesmo em um estágio inicial – ao regime nacionalista burguês de Lázaro Cárdenas.
Depois de analisar o caso do México, ele acrescentou: “Na realidade, a tarefa da burguesia consiste em liquidar os sindicatos como organismos da luta de classes e substituí-los pela burocracia, como organismos de dominação dos operários pelo Estado burguês”.
Hoje o Left Voice/LID está apoiando burocratas sindicais completamente integrados ao Estado imperialista, como demonstrado pela estreita colaboração do UAW com a administração do Biden na traição à greve, ao mesmo tempo em que apoia os aparatos no exterior que representam o imperialismo americano e canadense. Esses novos sindicatos no México estão sendo integrados quase que imediatamente ao atual partido Morena do governo do presidente Andrés Manuel López Obrador, que alinhou seu governo à política de guerra do imperialismo americano e canadense contra a China. Além disso, toda a estrutura legal da nova reforma trabalhista mexicana, que foi ordenada por Washington e Ottawa, dá poder de veto ao Ministério do Trabalho para reconhecer o registro de novos sindicatos e supervisionar suas eleições.
Trotsky, que teria desprezado os pseudoesquerdistas cúmplices do imperialismo de hoje, apresentou como principal demanda a “independência completa e incondicional dos sindicatos em relação ao Estado capitalista”. [Grifo no original]. Ele explicou:
Os sindicatos democráticos, no velho sentido do termo – de organismos no âmbito dos quais lutavam no seio da mesma organização de massas, mais ou menos livremente, diferentes tendências –, já não podem mais existir. Do mesmo modo que não se pode voltar ao Estado democrático burguês, tampouco é possível voltar à velha democracia operária. O destino de uma reflete o da outra. Na realidade, a independência de classe dos sindicatos quanto às suas relações com o Estado burguês, só pode, nas condições atuais, ser garantida por uma direção absolutamente revolucionária, ou seja, a direção da Quarta Internacional. Naturalmente, essa direção pode e deve ser racional e assegurar aos sindicatos o máximo de democracia concebível sob as condições concretas atuais. Mas sem a direção política da Quarta Internacional, a independência dos sindicatos é impossível.
O Comitê Internacional da Quarta Internacional é o único partido que defendeu a independência política dos trabalhadores durante todo o período pós-guerra e se opôs às inúmeras traições das burocracias sindicais, cujas lições devem ser cuidadosamente estudadas por todos os trabalhadores com consciência de classe. Desde então, o CIQI tem desenvolvido ainda mais a visão marxista sobre os sindicatos para “as condições concretas atuais”, enquanto trabalha intensamente dentro deles para libertar os trabalhadores das garras das burocracias.
Conforme explica David North em O último ano de Trotsky:
A tendência para o “crescimento conjunto” dos sindicatos, do Estado e das corporações capitalistas permaneceu durante todo o período pós-Segunda Guerra Mundial. Além disso, o processo de integração econômica global e a produção transnacional privaram os sindicatos de uma estrutura nacional na qual pudessem exercer pressão para reformas sociais limitadas. Não restou um único espaço para que os sindicatos recorressem, mesmo que moderadamente, aos métodos de luta de classes por ganhos mínimos. Os sindicatos, em vez de extrair concessões das corporações, foram transformados em coadjuvantes do Estado e das corporações, que servem para extrair concessões dos trabalhadores.
O processo de degeneração corporativista durante um período de oitenta anos impede, em todas as circunstâncias, exceto nas mais excepcionais, a ressuscitação dos antigos sindicatos. O caminho estratégico alternativo, levantado por Trotsky em 1938 no Programa de Transição, é a política que está de acordo com as condições atuais; ou seja, “criar em todas as instâncias possíveis organizações combativas independentes que correspondam mais precisamente às tarefas da luta das massas contra a sociedade burguesa e não hesitar, se for necessário, nem mesmo diante de uma ruptura direta com o aparato conservador dos sindicatos”.
Esse caminho, que implica a oposição revolucionária ao aparato sindical, aos seus apologistas de pseudoesquerda e à estrutura capitalista que eles defendem, é o único possível para a construção de organizações operárias genuinamente independentes e é o que orienta o trabalho da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (IWA-RFC).