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Brasil e EUA celebram 200 anos de relações diplomáticas enquanto Washington arrasta América Latina para guerra global

Em 26 de maio, o Brasil e os EUA celebraram os 200 anos do estabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países. O aniversário foi enfaticamente promovido pelo imperialismo americano enquanto tenta arrastar o Brasil e a América Latina como um todo para o seu impulso crescente para a guerra global.

A comandante do Comando Sul dos EUA, General Laura Richardson, discursando na cerimônia que marcou o bicentenário das relações diplomáticas Brasil-EUA, realizada a bordo do porta-aviões USS George Washington

Por trás de todos os discursos que celebraram a “amizade histórica” entre os dois maiores países das Américas, os EUA estão realizando amplos exercícios militares com o Brasil e praticamente todos os países da América do Sul, ao mesmo tempo que estão lutando para garantir o seu controle sobre os recursos naturais da região. Isso inclui uma pressão contínua sobre o Brasil para firmar acordos com Washington para a exploração de minerais críticos do país.

Tanto as iniciativas comerciais quanto as militares estão sendo promovidas pelo imperialismo americano como medidas de guerra contra seus “concorrentes estratégicos” na região – Irã, Rússia e, acima de tudo, China, que no final dos anos 2000 ultrapassou os EUA e se tornou o principal parceiro comercial dos principais países latino-americanos, inclusive o Brasil.

As declarações das autoridades americanas e aquelas escolhidas pelo governo Biden para representá-lo nas celebrações no Brasil expressaram a forma belicosa que o imperialismo americano encarou esse aniversário. O Secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, elogiou em 27 de maio a “parceria bicentenária” entre Brasil e EUA, declarando em nota oficial: “Fomos aliados na Segunda Guerra Mundial, quando as forças dos EUA e do Brasil lutaram lado a lado na Campanha da Itália, demonstrando coragem e sacrifício que contribuíram para a vitória”.

A principal autoridade americana presente no Brasil foi a General Laura Richardson, chefe do Comando Sul dos EUA (SouthCom). Como o SouthCom escreveu no X/Twitter no dia de sua chegada ao país em 20 de maio, o objetivo de sua viagem foi “explorar maneiras de aprofundar a cooperação no setor de defesa”.

Na principal cidade da indústria de defesa do Brasil, São José dos Campos, ela e autoridades militares americanas participaram em 21 de maio de uma mesa redonda no centro de tecnologia da Boing e depois visitaram a gigante de aviação Embraer, que também produz aviões militares, onde “discutiram parcerias de defesa nos setores aeroespacial e de defesa”, de acordo com o SouthCom.

No que pode ser considerada a celebração oficial da “parceria bicentenária”, a Gen. Richardson, a embaixadora americana no Brasil, Elisabeth Bagley, e autoridades militares brasileiras participaram em 22 de maio das comemorações de 200 anos no porta-aviões nuclear USS George Washington. Ele e seu grupo de ataque estiveram no Brasil como parte da operação militar Southern Seas 2024, “um testemunho da parceria de longa data entre os dois países”, segundo a embaixada americana no Brasil.

Depois de exercícios militares com a Marinha do Brasil entre 17 e 19 de maio na costa do Rio de Janeiro, o USS George Washington seguiu viagem para os outros países sul-americanos litorâneos para “aprimorar a capacidade, melhorar a interoperabilidade e fortalecer as parcerias marítimas”, segundo o SouthCom. Ele está agora rumando para o Peru, onde está sendo realizado o exercício militar multinacional Resolute Sentinel 2024 envolvendo 1.500 militares do Peru, Colômbia, Equador, Chile, Brasil, França e Estados Unidos.

Durante a visita ao Brasil, a General Richardson intensificou o repúdio do imperialismo americano ao direito dos países latino-americanos de estabelecerem qualquer tipo de parceria com a China, o Irã e a Rússia, países que têm os “regimes autoritários em Cuba, Nicarágua e Venezuela” como seus principais parceiros, como afirmou em março em uma audiência no Congresso dos EUA.

Em uma entrevista em 24 de maio ao jornal Valor Econômico, ela elogiou as parcerias entre os EUA e “democracias de mentalidade semelhante” na região que respeitam a “soberania” e o “povo”, “o que não acontece com um país comunista [uma referência à China], porque eles não respeitam os direitos de seu próprio povo.”

Ela ainda criticou um possível ingresso do Brasil na Iniciativa Cinturão e Rota de Pequim, que já conta com a participação de 21 de 31 países latino-americanos. Segundo a Gen. Richardson, essa iniciativa “parece muito boa na parte inicial ... [mas] a soberania é retirada ao longo do tempo se os empréstimos não forem pagos.” Em contraposição, ela incentivou o Brasil a ingressar na Parceria Americana para a Prosperidade Econômica de Washington, estabelecida em 2022 entre os EUA e 10 países latino-americanos com o objetivo de integrar a cadeia de suprimentos, incluindo a exploração de minerais críticos exigidos para a “transição energética”.

A resposta chinesa veio em 26 de maio através do porta-voz da Embaixada da China no Brasil. Ele se referiu às “completas mentiras políticas” da Gen. Richardson em relação à China, dizendo ainda que os EUA “adotam uma mentalidade típica da Guerra Fria e obedecem a uma lógica hegemonista.” Ele também lembrou do “histórico sujo” dos EUA na região, que “se valeram da ‘democracia’ e dos ‘direitos humanos’ como pretexto para agredir, sancionar e interferir nos países da região, trouxeram caos e tragédias para muitas nações.”

O histórico de golpes militares de Washington e de outras intervenções imperialistas no Brasil e em toda a América Latina foi completamente enterrado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores - PT) nas comemorações do bicentenário das relações diplomáticas com os EUA. Entre eles, o mais notório é exatamente o golpe de Estado de 1964 apoiado pela CIA no Brasil, que inaugurou uma sangrenta ditadura militar de 21 anos que esmagou a classe trabalhadora e a oposição política e transformou o país num palco para as intervenções do imperialismo americano em toda a região.

A tentativa deliberada de Lula de encobrir esse “capítulo negro” na história das relações EUA-Brasil está continuando os esforços de seu governo para “virar a página” da história do golpe militar no seu recente aniversário de 60 anos.

Tais esforços tem sido realizados pelo PT para apaziguar as relações com os militares brasileiros, que estiveram diretamente envolvidos na recente conspiração para realizar um golpe de Estado liderado pelo ex-presidente fascistoide Jair Bolsonaro. Desde então, os generais brasileiros têm fortalecido cada vez mais os seus laços com os militares dos EUA, seja através de parcerias oficiais apoiadas por Lula ou através de canais manifestamente extraconstitucionais não contestados pelo PT.

Numa clara demonstração de sua subserviência ao imperialismo, o governo petista realizou o seminário “200 anos de amizade Brasil-EUA”, no qual o ministro das relações exteriores Mauro Vieira fez uma revisão das relações históricas entre os dois países. Ele ressaltou que, sob os governos Lula e Biden, o Brasil e os EUA estão avançando agendas comuns que refletem a preocupação com a “proteção das nossas instituições democráticas, a promoção da igualdade racial [e] ... o combate à mudança do clima”.

Diante da “formação de uma ordem crescentemente multipolar,” ele disse que está convencido de que “Brasil e EUA podem atuar conjuntamente para impulsionar a reforma da governança global ... [e] tornar a ordem internacional mais justa, harmônica e equilibrada”.

Longe de significar um desafio ao imperialismo americano, a defesa de um “mundo multipolar” pelo governo Lula tem o objetivo de garantir ao capital brasileiro um melhor lugar no tabuleiro de xadrez político global cada vez mais explosivo dominado pela ameaça de uma nova guerra mundial imperialista. Uma das principais peças estratégicas que o governo Lula acredita ter em mãos são os recursos naturais do Brasil exigidos para as chamadas “economia verde” e “transição energética”.

Apesar de os EUA serem o maior investidor no Brasil, empresas chinesas têm investido crescentemente em infraestrutura de telecomunicações e no setor de mineração, particularmente a extração de nióbio – um mineral crítico usado em ligas para as indústrias aeroespacial, automotiva, de armas e eletrônica, que o Brasil é responsável por mais de 90% da produção mundial. Recentemente, duas empresas de veículos elétricos chineses, a BYD e a GWM, decidiram construir fábricas no Brasil, e a BYD está também negociando a compra da maior mineradora de lítio no país.

Tentando reverter essa situação, a embaixadora americana no Brasil, Elizabeth Baglay, declarou em 14 de maio numa entrevista à Folha de S. Paulo que a Secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, que tem estado na linha de frente da guerra econômica dos EUA com a China, e o ministro da fazenda do governo Lula, Fernando Haddad, iniciaram discussões sobre “minerais críticos, hidrogênio verde.”

Responsável pelo Plano Brasileiro de Transformação Ecológica, Haddad disse durante a assembleia geral da ONU em setembro passado, que “queremos abrir possibilidades novas para que Brasil e EUA se aproximem com ganhos mútuos” e defendeu que o país se encaixe na Lei da Redução da Inflação, a legislação americana de incentivo à “economia verde”. Ele também tem insistido que a “transformação ecológica” representa “a grande oportunidade que o Brasil tem de se reindustrializar”, enquanto o governo Lula, com o apoio dos sindicatos, tem defendido que seu governo está comprometido numa “transição justa”.

Expondo o caráter reacionário da perspectiva do PT de “reindustrializar” o Brasil, membros do governo e acadêmicos ligados ao partido têm defendido cada vez mais as políticas industriais da ditadura corporativista de Getúlio Vargas durante a Segunda Guerra Mundial como um modelo para o presente. Quando os EUA entraram na guerra, estabeleceram acordos com o Brasil para matérias primas estratégicas como borracha, minério de ferro e manganês. Em 1942, Vargas aceitou a instalação de uma base aérea americana no Rio Grande do Norte em troca do financiamento da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que impulsionou o desenvolvimento da indústria brasileira na segunda metade do século XX.

Por trás das alegações hipócritas e falidas de que o aumento da integração com a chamada “transição ecológica” de Washington e a exploração de minerais críticos representam uma perspectiva para a reversão da desindustrialização histórica do Brasil, o PT e os seus satélites pseudoesquerdistas estão manifestando a sua orientação em direção ao imperialismo e às oportunidades geradas pelo impulso à guerra mundial para o capitalismo brasileiro.

O resultado do processo histórico de dois séculos de ascensão e declínio do imperialismo americano não tem sido uma “ordem internacional mais justa, harmoniosa e equilibrada”, como afirma Vieira, mas a explosão do militarismo que ameaça a América Latina e o mundo com uma catástrofe nuclear. A única resposta progressista a essa ameaça é o desenvolvimento de um movimento revolucionário da classe trabalhadora internacional pelo socialismo.

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